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Germânia (98 d.C.) - Tácito

I
Toda a Germânia está separada das Gálias, da Récia e da Panônia pelo Reno e Danúbio; da Sarmátia e da Dácia por alguns montes e por seus mútuos temores. [2] O resto é circundado pelo Oceano, abrangendo golfos espaçosos [3] e vastas ilhas, com habitantes e reis que a guerra nos fez descobrir recentemente. O Reno nasce de um despenhadeiro inacessível dos Alpes Récios, e depois de torcer um pouco para o poente desemboca no oceano setentrional. O Danúbio, espalhado de um monte pouco elevado e de acesso suave no monte Abnoba, passa por muitos povos até que se lança ao Ponto Euxino por seis bocas [4], a sétima some nos pântanos.

II
Creio que os germanos são naturais da própria terra e que jamais se mesclaram com a vinda e hospedagem de outros povos; pois, antigamente, todos que emigravam não iam por terra senão por mar e são raros os navios que de nosso mundo se aventuram a penetrar no Oceano imenso e, por assim dizer, oposto ao nosso [5]. Ainda sem o perigo e o horror de um mar desconhecido, quem abandonaria a Ásia, África ou Itália para dirigir-se a essa Germânia áspera, de clima duro e de aspecto tão ingrato, não sendo para seus naturais?

Entoam velhos cantos (que são sua única história e todo os seus anais) ao deus Tuistão, nascido da terra, e a seu filho Mano, como raízes e fundadores de sua nação. A Mano dão-lhe três filhos, dos quais tomaram nome os ingevões, que são os mais costeiros, os herminões, que ocupam o centro, e os istevões, que são os restantes [6]. Alguns, porém, baseados em tal antigüidade, aumentam o número dos filhos do deus e aludem à denominação de mares, gambrívios, suevos e vândalos, afirmando que estes são seus verdadeiros e primitivos nomes e que o de Germania é novo e foi incorporado há pouco, pois os primeiros que passaram o Reno, desalojaram os galos, e agora se chamam tungros os que se chamavam germanos, de modo que um nome que era só de uma parte do povo foi prevalecendo até o ponto em que, desta denominação, tomada a princípio pelos vencedores para inspirar terror [7], e adotada depois por todo o povo, chegaram todos a chamar-se germanos [8]. Também falam que houve entre eles um Hércules [9], a quem cantam como herói sem par quando se dirigem ao combate.

III
Possuem também outras canções que chamam bardito [10], cuja entoada anima-os ao combate e anunciam à boa ou má fortuna que vai ter lugar, segundo o efeito que lhes causa o som. Mais que harmonia de vozes, aquilo parece ser a expressão de seu valor, pois procuram sobretudo produzir um som áspero e um murmúrio entrecortado e colocam o escudo à boca para que a voz ressoe e fique mais cheia. Dizem alguns que Ulisses, ao chegar a esse Oceano em sua grande e fabulosa viagem, chegou à Germânia e fundou e deu nome a Arciburgio [11], cidade situada às margens do Reno e que ainda está habitada. Dizem que foi encontrado um altar consagrado a Ulisses com o nome de Laertes, seu pai, e que ainda existem nos confins da Germânia e da Récia alguns monumentos e tumbas com inscrições gregas. Não tenho intenção de confirmar nem de refutar com argumentos estas notícias; cada um pode dar-lhes crédito ou não segundo sua inclinação.

IV
Sou da opinião dos que crêem que os povos da Germânia não se alteraram por casamentos com nenhuma outra nação e que são uma raça singular, genuína e semelhante só a si mesma. Portanto, possuem uma perfeita analogia de figura entre eles, ainda que tão numerosos; são de olhos azuis e selvagens, de cabelos ruivos, corpo avantajado e forte só para o ataque violento, mas não suportam com resignação os trabalhos e as fadigas, metem-lhes medo o calor e a fadiga, todavia toleram a fome e o frio por afeitos à avareza e à inclemência do clima.

V
Este, se bem que desigual em algumas regiões, é universalmente sombrio pelos muitos bosques que o formam e desagradável pelos muitos pântanos que o encharcam. Para o lado das Gálias é mais úmido e mais exposto aos ventos para o lado da Nóvica [12] e da Panônia [13]. É fértil em grãos porém, não em árvores frutíferas. É fecundo em rebanhos, mas de proporções reduzidas. Os bois não apresentam pela conformatura e os adereços que lhes ornam a fronte são pobres no tamanho [14]. Amam a abastança e são estas já citadas as suas únicas e mais gratas riquezas. Não sei se foi por mal ou por bem, o certo é que os deuses lhe negaram o ouro e a prata.

Contudo, não me atreveria a assegurar não existia alguma mina desses nobres metais. Quem, porventura, já o investigou? O fato é que eles não lhes emprestam o valor que lhes dão os demais povos. Entretanto, vêm-se ali vasos de prata que costumam presentear os seus embaixadores e príncipes. Porém, não os estimam mais do que se fossem de barro. Sem embargo, os que vivem em nossas fronteiras, tendo em vista o comércio, apreciam o ouro e a prata e, por isso, selecionam algumas espécies das nossas moedas. Os do interior, atendo-se à velha usança, permutam as mercadorias com a maior simplicidade, trocando umas coisas por outras. Preferem a moeda de cunho antigo e, por esta razão, mais conhecida como serratos e bigatos [15] e se inclinam mais pela prata do que pelo ouro, não em virtude de pontos de vista particulares, mas porque as moedas de prata é dinheiro mais cômodo para os que mercadejam objetos comuns e baratos.

VI
Como se pode supor pelas suas armas, não há ali ferro em abundância. Pouco se servem de espadas ou de compridas lanças. Os dardos que manejam — “frâmeas” na língua indígena — são aparelhados de um ferro delgado e curto, porém tão agudo e de tão fácil prática que, de acordo com as necessidades, com eles pelejam de perto ou de longe. Os cavaleiros se contentam com o escudo e com uma frâmea. A infantaria está equipada também de armas de arremesso e cada soldado carrega muitas delas e as conseguem lançar a longas distâncias. Andam nus ou ligeiramente vestidos de um curto saião. Não há nenhum adorno em seus vestuários. Apenas os escudos são pintados de cores agradáveis. Poucos trazem lorigas e um ou outro, capacete de metal ou couro. [16]

Os cavalos não primam pela elegância do porte nem pela agilidade e nem tampouco são treinados na variação dos movimentos (ou manobras) como é usual entre nós. Adestram-nos a avançar em frente ou a voltar à direita, em linha tão compacta que nenhum pode ficar para trás. Tudo bem considerado, conclui-se que sua força principal reside na infantaria e, por esse motivo, combatem de roldão, afinando, admiravelmente, o prélio eqüestre com a rapidez dos infantes, pois estes recrutados entre os jovens mais ágeis, são colocados na vanguarda. Há deles um número limitado: cada aldeia fornece “cem”. Daí o nome que lhes dão. Ficou-lhes como título de dignidade de honra o que a princípio não era senão um número (pois “cem”). O exército é formado em cunha. O retirar-se para depois tornar a ofensiva é considerado mais ardil e prudência do que medo. Por mais duvidosa que lhes pareça a batalha recolhem os corpos dos seus soldados tombados em campo. Consideram crime e opróbrio o perder o escudo no entrebate: ao soldado assim informado, não lhes permite assistir aos sacrifícios, nem tomar parte nas assembléias. Muitos destes, embora escapos à batalha, põem termo à ignomínia, enforcando-se.

VII
Os reis são eleitos conforme a sua nobreza, mas os capitães, escolhidos segundo a sua capacidade. O poder dos reis, entretanto, não é ilimitado ou absoluto e os chefes comandam mais pelo exemplo dos seus atos e pelo atrevimento das suas ações do que pela força da sua autoridade. Se se mostram ousados e destemidos e conseguem arrebatar a vitória, governam sob admiração dos povos. Entretanto a ninguém, a não ser aos sacerdotes, se consente o direito de açoitar, prender ou matar: a pena não é considerada como castigo ou execução das ordens de um comandante, mas imposta pelos deuses que, como crêem, presidem aos combates.

Por esse motivo levam ao campo de refrega certas imagens e simulacros retirando-os dos bosques sagrados. O que, porém, representa o principal sentido da sua valentia é o fato de que em lugar de constituírem um aglomerado de gentes as mais diversas, pelo contrário, cada turma de cavalaria e cada esquadrão de infantaria são formados de homens da mesma família ou então por membros de nações aliadas. Ao se colocarem para o combate, postam perto de si tudo quanto mais amam: afim de que, assim, possam ouvir o vozerio das mulheres e a gritaria das crianças, fiéis testemunhas da sua coragem e cujos louvores são os de que mais prezam e mais gostam de ouvir. Toda vez que recebem ferimentos vão mostrá-los às mães e às esposas e não se atemorizam de contá-los e de examiná-los com cuidado: antes, muito embora tal situação, dedicam-se à exortar os companheiros e a provê-los de víveres.

VIII
Há memória que algumas hostes que estavam desmaiando e cedendo foram refeitas pelas mulheres que, pela insistência de seus rogos e seus seios desnudos, mostravam a eles a iminência de seu cativeiro, que eles temem com muito mais horror para suas mulheres que para si. Tanto é assim, que a melhor maneira de assegurar a lealdade das cidades é exigir-lhes donzelas nobres como reféns. Além disso, acreditam que o sexo feminino possui algo de divinatório e de profético, pois não desprezam seus conselhos nem deixam de cumprir seus pedidos. No tempo de Vespasiano [17], vimos Velada ser honrada em muitos lugares como divindade. Em outro tempo veneraram Aurinia e muitas outras, mas não por adulação nem para divinizá-las.

IX
Sua divindade mais venerada é Mercúrio. Para aplacar-lhe as iras em certos dias do ano julgam lícito imolar-lhe vítimas humanas. Aplacam a Hércules e a Marte com animais rituais. Alguns dos suevos também fazem sacrifícios a Ísis. Não pude averiguar qual a causa ou a origem desse culto, embora a mesma imagem, em forma de nave libúrnia [18], mostra que o culto é estrangeiro. Seja como for, pensam que encerrar os deuses entre quatro paredes e representá-los sob forma humana lhes parece contrário à majestade celeste. Por esse motivo, consagram-lhes selvas e bosques, e dão nomes de deuses a esses misterioros lugares que só olham com olhos reverentes.

X
Nenhum outro povo leva mais a sério os augures e as adivinhações. A prática de tirar as sortes [19] é simples: dividem um ramo de árvore frutífera em pequenos pedaços que, depois de marcados com certos sinais, são lançados a esmo sobre uma veste branca. A seguir, o sacerdote da cidade, se se trata de negócio público, ou o pai de família, se se trata de assunto doméstico, após haver deprecado os deuses, erguendo os olhos ao céu, toma de três fragmentos da haste, um de cada vez, e faz a interpretação de acordo com os sinais previamente impressos. Se as decisões são contrárias aos que se esperava, naquele dia não se realizam mais consultas a respeito. Se, porém, são favoráveis, requer-se a confirmação dos auspícios. É uso ali, também, consultar-se o canto e o vôo das aves.

Contudo, constituem auspícios peculiares desta raça os presságios tomados do relinchar dos cavalos. Estes animais são sustentados à custa do erário nas próprias selvas e nos bosques sagrados. Tem o pêlo branco e jamais foram profanados nos serviços dos homens. Atrelam-se a um coche santificado e o sacerdote, ou o rei, ou o principal da cidade, os acompanham e lhes observam o nitrido e o respirar. A nenhum outro auspício dão tanto crédito como a esta. Não somente o povo mas também os nobres e os grandes e os sacerdotes vêm nestes cavalos confidentes dos deuses, quando eles, na realidade, não passam de simples ministros. Há ainda outra espécie de auspício, por meio do qual procuram saber antecipadamente o resultado das guerras mais importantes. Seqüestram, não importam como, um prisioneiro de nação inimiga e o obrigam a lutar com um dos seus melhores guerreiros. Ambos os contendores se batem, cada qual com as armas do seu país. A vitória deste ou daquela é o presságio do futuro.

XI
Os príncipes [20] deliberam a respeito das coisas mais simples. As de maior importância são tratadas em assembléia geral, mas de modo que, mesmo os negócios cuja solução cabe ao povo sejam em primeiro lugar debatidos entre os maiores. Reúnem-se para tratar dos interesses públicos — caso não sobrevenha um imprevisto — em determinados dias, pela lua nova ou no plenilúnio, pois consideram este tempo como o mais favorável para qualquer empreendimento. Não contam como nós os dias, mas as noites e é por este sistema que datam e autenticam todos os documentos: para eles a noite precede o dia. A liberdade de que gozam os arrasta a certos abusos: não se dirigem, em conjunto, às assembléias, como o povo que venha a ser convocado para tal: reúnem-se a pouco e pouco, lentamente, no que gastam dois ou três dias.

Quando acham que há número suficiente começam a deliberar, de armas na mão. O silêncio é imposto pelos sacerdotes, aos quais cabe também o direito de punir. Em seguida, o rei ou o chefe se faz ouvir na sua exposição e, após este, os demais segundo a idade, nobreza ou fama adquirida na guerra, ou de acordo com a sua eloquência, valendo nisto mais a persuasão do que a autoridade temporal do orador. Se não lhes agrada a proposição, rechaçam-na com grande sucesso. Se merece acolhimento, aprovam-na, brandindo as frâmeas. A aprovação mais honrosa é a feita com a agitação das armas.

XII
Qualquer pessoa pode acusar outra perante a assembléia, mesmo em se tratando de crimes capitais. As penas variam de acordo com o delito. Para os traidores e os trânsfugas, o enforcamento nas árvores. Os covardes ou efeminados, os infames pelo tráfico do corpo são afogados nos pântanos com uma grade em cima do corpo. A disparidade do suplício tem como mira tomar conhecida a punição dos crimes e ocultar os flagícios. Contudo, nos delitos menos graves há proporcionalidade na pena: aos convencidos ou confessos, a multa de uns tantos cavalos ou cabeças de gado. Parte da multa é paga ao rei ou a comunidade, parte ao ofendido ou aos seus parentes. Elegem igualmente nestas assembléias os chefes que administram justiça nas vilas ou nas aldeias. Cada qual é assistido por cem homens escolhidos entre o povo, que lhe servem de conselheiros e encarnam a autoridade.

XIII
Não tratam de nenhum negócio público ou particular senão armados. Entretanto, não fornecem armas a pessoa alguma sem prévia aprovação da comunidade, isto é, sem que o Estado a considere capaz de empunhá-las. Então, ali mesmo, na assembléia, um dos príncipes ou mesmo o pai ou parente armam o jovem com o escudo e a frâmea [21]. Esta representa entre eles a toga viril [22]; esta, a primeira distinção da mocidade: antes o mancebo era apenas membro da família, agora é um cidadão da república. Nobreza preeminente ou assinalados serviços paternos conferem aos filhos, embora de pouca idade, o título de príncipes. Estes se agrupam em redor dos quais robustos e da maior experiência que, por seu turno, não se sentem dominados por ver aqueles formando nas suas hostes.

Há mesmo entre os companheiros postos hierárquicos outorgados ao arbítrio dos comandantes e entre aqueles nota-se grande emulação. Os companheiros do príncipe procuram por todos os meios alcançar o primeiro lugar junto dele e os chefes põem todo o seu cuidado em ter muitos e valentíssimos companheiros. Considera-se fastígio e poderio o andar-se sempre acompanhado de um grupo de moços escolhidos. Em tempo de paz isto é levado a conta de ornamento, de fausto, mas em tempo de guerra, à de defesa. O avantajar-se aos demais em número e qualidade dos companheiros, não apenas dá fama e respeito, em face da sua tribo, mas também em relação às cidades circunvizinhas, pois atrai a amizade dos povos, que lhes enviam embaixadas, os mimam com presentes e, não raro, esse prestígio consegue evitar as guerras.

XIV
É desonroso para o príncipe ser excedido em bravura no campo de batalha pelos seus soldados, como é desonra para estes, em igual circunstâncias, não igualar o príncipe em valor. É porém, acima de tudo, opróbrio e covardia, sobreviver ao seu chefe morto na peleja. Defendê-lo, salvá-lo, enaltecer-lhe os próprios feitos, dourar-lhe a glória é o primeiro e o mais essencial dos compromissos assumidos sob juramento. Os príncipes combatem pela vitória e os que o obedecem, pelo príncipe. Se a comunidade a que pertencem [23] cai na pasmaceira e no ócio, durante longo tempo, a mocidade nobre passa, com armas e bagagens, alegremente, para os países que se acham em guerra: porque esta gente odeia a paz e o repouso e se lhe afigura mais fácil ganhar nomeada no arrostar perigos. Com tal estado de espírito, só é possível mantê-la, pois, sob a violência das armas. E torna-se impossível aos príncipes sustentar tal comitiva a não ser por meio de pilhagem e da guerra, portanto: da sua liberalidade exigem os que o cercam ora um bom cavalo, ora uma frâmea vitoriosa, tinta de sangue do inimigo. Além disso, os banquetes, embora sem requinte, porém abundantíssimos, substituem o soldo ou estipêndio. A munificência dos chefes é alimentada pela guerra e pelo saque. Mais facilmente se deixarão persuadir pela necessidade de provocar o inimigo, de se exporem aos ferimentos ou mesmo à morte do que pelas vantagens do cultivo das terras e pela promessas das abundantes colheitas. Demais, afigurar-se-lhes objeção e poltroneria adquirir as coisas com o suor do rosto, se o podem conseguir ao preço de sangue.

XV
Quando não estão empenhados em guerras, não obstante concedem algum tempo à caça. O maior tempo, entretanto, é consagrado à vadiagem, ao sono, e à glutonaria. Nenhum homem forte e belicoso se a inclina ao trabalho, pois entregam ao cuidado das mulheres as moradas, os serviços domésticos e os do campo. Assim, tanto amam a inércia como aborrecem o repouso. De acordo com a tradição, as cidades e os indivíduos devem enviar um presente ao príncipe, seja em gado, seja em frutos. Estas dádivas todavia, posto tomadas em conta de homenagem, servem para prover as necessidades reais. Apreciam sobremaneira os presentes dos povos vizinhos que lhes são feitos não só por particulares mas também oficialmente, pelos poderes públicos, tais como cavalos escolhidos, armas poderosas, jaezes, colares. Nós já lhes ensinamos a aceitar dinheiro também.

XVI
É sabido que os germanos não habitam em cidades cercadas nem admitem a construção de casas umas próximas das outras. Vivem divididos e separados, conforme lhes agrada a fonte, o prado, o bosque. Não edificam as aldeias como edificamos as nossas: os edifícios contíguos entre si. Circundam cada casa de certo espaço: ou por precaução contra incêndios ou para prevenir-se contra assaltos, ou por ignorância na arte de construir.

Tampouco usam a pedra ou a telha. Empregam na obra a madeira bruta, sem preocupação de sentimentos estéticos. Revestem algumas partes de terra tão pura e resplandecente que parece oferecer alguns traços coloridos, imitando pintura. Também costumam escavar subterrâneos, cobertos por cima com grande quantidade de esterco, que servem de abrigo para as pessoas e de armazém para os víveres: ali dentro o rigor do frio é atenuado e, se porventura se verificar a invasão do inimigo, este só rouba o que encontra à vista, mas o que está oculto ou enterrado escapa-lhe à rapina por não saber onde está.

XVII
A vestimenta comum é o saio, atacado com fivela ou, se não há, com uma espinha: o resto do corpo anda descoberto e por isso ficam durante dias inteiros em casa, junto ao fogo. Os mais ricos se distinguem pelo traje, não tão amplo como o dos sármatas ou o dos partos, mas bem ajustado e tanto, que se lhes desenham os contornos do corpo. Vestem-se do mesmo modo, de peles de feras: os que residem nas margens do Reno não dão a essas peles a menor importância, porém os do interior procuram aprimorá-las, pois não encontram no comércio meio de adquirir outros vestidos.

Escolhem os animais e, tirando-lhes a pele, adornam-na de manchas e a entretecem com a de outros bichos produzidos pelo oceano mais setentrional [24] e por um mar que nos é desconhecido [25]. As mulheres não trajam de maneira diversa dos homens: usam elas, comumente, roupas de linho, listradas de púrpura e não alongam a parte superior do vestido em forma de mangas, contudo deixam nus ombros e braços. A parte superior do peito também fica desnudada.

XVIII
O matrimônio é, entre eles, severamente acatado e não há nos seus costumes coisa que mereça mais louvor. São os germanos quase os únicos bárbaros que se contentam com uma só mulher, exceto alguns maiorais, que tomam para si várias esposas, e, isso não por devassidão, mas por alardear nobreza. A mulher não oferece dote ao marido, porém o marido à mulher.

O pai, a mãe e os parentes intervêm e controlam os presentes de noivado. Estes presentes não são escolhidos de molde a encantar os olhos de uma mulher, nem para enfeitar noiva: juntas de bois, cavalos ajaezados, escudos com frâmea e espada. E entregues os presentes, o noivo recebe a mulher que, por seu turno, oferece as armas ao marido. Eis o vínculo solene, a cerimônia misteriosa — os deuses conjugais. Afim de que a mulher não se julgue desobrigada de pensamentos virtuosos nem alheia aos negócios da guerra é advertida, logo ao início do rito nupcial, de que deve partilhar com o marido dos trabalhos e dos perigos que ele enfrentar e lhe deve solidariedade perfeita nos sofrimentos e nas façanhas que alcançar, tanto na paz como nos campos de batalha. Nem outra coisa simbolizam os bois ungidos o cavalo aparelhado e as armas que lhe deram: assim deve viver e assim deve morrer. E o que recebe, cumpre-lhe transmitir, sem mácula, aos filhos que vierem. E é digno também que o recebam as noras para que de novo possam transmitir aos netos.

XIX
Desta sorte, a virgindade das mulheres está garantida contra os atrativos corruptores dos espetáculos e as excitações dos festins. Homens e mulheres ignoram a correspondência secreta. Os adultérios são raríssimos entre povo tão numeroso e quando os há a punição não se faz esperar e cabe ao marido ministrá-la. Depois de cortar-lhe os cabelos e desnudá-la na presença de parentes, o marido a expulsa de casa e, a golpes de açoite, condú-la através da aldeia em que habitam, pois diante de tal desonra não pode haver misericórdia.

Não obstante a mocidade, a formosura e os cabedais de que fosse senhora e dona, uma adúltera não encontraria nunca mais quem a recebesse como esposa. Aí ninguém faz ostentação de vício, nem considera moda o corromper ou ser corrompido. Mais escrúpulos se encontram ainda em mulheres das cidades, onde só as donzelas casam e onde se condescende, pela última vez, as esperanças e ao voto da mulher. Unem-se, assim, ao marido como para formar com ele um só corpo, uma só vida. Seus desejos e pensamentos não podem ir além do seu marido e não é ao marido que elas ama, mas ao casamento tão somente. Limitar-se o número de filhos ou por termo à vida dos já nascidos é crime gravíssimo e, entre eles, pode mais a tradição do que as leis em qualquer outra parte do mundo.

XX
Criados, geralmente, na nudez e na sordidez, crescem até atingir a compleição e vigor que lhes admiramos. As mães não entregam os filhos as servas ou as damas: elas próprias os amamentam. O senhor e o escravo não se diferenciam por nenhum refinamento educacional: vivem por entre os mesmos rebanhos, dorme sobre o mesmo chão, até que a idade separe os homens livres e o seu valor obrigue a reconhecê-los como tais. A mocidade conhece tardiamente a Vênus, o que concorre para lhes assegurar seiva e saúde inesgotáveis. Não há pressa em efetuar o casamento das donzelas: ambos os sexos, igualmente jovens e igualmente desenvolvidos, se unem, robustos e sadios e, assim, os descendentes destes casais podem reproduzir, magnificamente, a virilidade dos pais.

Os filhos de uma irmã gozam tanta a afeição dos tios como dos próprios pais. Pensam alguns que este parentesco é mais estreito e inviolável e quando se trata de reféns, preferem antes ao sobrinhos por se tratar de entes mais queridos da família. Contudo, os filhos são sempre os herdeiros sucessores e por isso nem se torna necessário o testamento. Se não há filhos herda o grau imediato, os irmãos, os tios paternos, os maternos. Quanto maior é o número de parentes tanto mais avultado o dos afins. Deste modo, tanto mais acatada é a velhice. Considera-se desdouro o não ter filhos.

XXI
Tem-se como dever aceitar, em herança, os ódios e as malquerenças quer do pai, quer dos parentes. Os ódios, porém, não são implacáveis. Porque os agravos e até mesmo o homicídio se resgatam com certo número de cabeças de gado e toda a família aceita esta satisfação, pois tal ato é considerado como serviço prestado à República: os ódios são perigosíssimos para homens que vivem em liberdade.

XXII
Não há nação mais antiga de festins nem de dar agasalho aos que a procuram. Fechar a porta a um peregrino é tremendo crime. Cada qual, de acordo com suas posses, acolhe sob o seu teto e a sua mesa. Si, porém, lhe falece toda e qualquer ajuda, deve então enviar o hóspede à casa do vizinho, onde, se bem não hajam sido convidados — o que não vai ao caso — são acolhidos com a mesma humanidade sem que se estabeleça diferença, quanto ao acolhimento, entre o conhecido e o ádvena. É costume ao hóspede de partida se lhe dar o que haja pedido, mas aos de casa que lhe deram guarida concede-se também a mesma faculdade. Estimam os presentes, mas não encarecem os que dão nem agradecem os que recebem.

XXIII
Assim que despertam, pois de ordinário se levantam já com alto sol, lavam-se às mais das vezes em água quente, como se vivessem em permanente inverno. Após a ablução, comem: cada qual à parte, em mesa separada. Para tratar de negócios, ou quase sempre para o prazer dos banquetes, vão armados. Passar o dia e a noite em beberagens não se considera ato vexatório. As rixas, inevitáveis entre eles e poucas vezes ficam no terreno das injúrias: terminam comumente em ferimentos ou morte.

Contudo, procuram os banquetes como bela ocasião para reconciliar inimigos, contratar casamentos, escolher generais ou ventilar negócios concernentes à paz ou à guerra. Pensam eles que não há momento tão propício, como este, para se abrir mais facilmente a franqueza nem experimentar mais ardor das grandes idéias. Homens sem astúcia nem agilidade de espírito, aproveitam ainda o abandono e o júbilo dos divertimentos para auscultar o fundo do próprio coração. Desta maneira ficam descobertos e completamente nus o pensamento e a intenção de cada qual. No dia seguinte voltam a debater as mesmas questões e salva-se o que pertence aos dois opostos ensejos: deliberam, quando não sabem fingir e resolvem, quando não podem errar.

XXIV
Como bebida fabricam um licor de cevada e trigo fermentado à semelhança do vinho. Os habitantes próximos do Reno também compram esta bebida. A alimentação é simples: frutos silvestres, caça recém abatida e leite coalhado. Saciam a fome sem temperos nem especiarias. Em relação à sede, porém, não há tal temperança. Se se lhes desse a beber quando desejassem, não seria menos fácil convencê-los com a embriaguez do que com as armas.

XXV
Possuem apenas um gênero de espetáculo e o repetem em todas as reuniões. Rapazes nus que se exercitam neste jogo, saltam e dançam por entre as pontas das espadas e das frâmeas contrapostas. O exercício lhes ensinou a arte e a arte deu-lhes garbo e elegância. Não o praticam, entretanto, por ganância ou visando lucro de qualquer espécie, porque a recompensa da sua audaz temeridade é o entusiasmo com que se manifestam os espectadores. Os jogos dos dados — fato espantoso! — assumem para eles, quando não embriagados, uma ocupação séria e os jogam tão apaixonadamente que, à falta de tudo o mais, jogam, em último lanço, o corpo e a liberdade. O vencido sujeita-se espontaneamente à escravidão e, embora mais moço e mais robusto, consentem que o manietem e o vendam: tal é a sua obstinação no vício. E a isto chamam fidelidade! [26] Os servos assim havidos são postos à venda afim de se livrarem também os vendedores da vergonha que lhes acarreta tal vitória.

XXVI
Quanto aos demais escravos [27], não os empregam, como nós, nos vários misteres domésticos. Cada qual tem habitação própria, seus próprios penates e se governa a si mesmo. Recebe certa quantidade de gêneros, de gado e de roupas, como um colono, e nisto se cifra a sua servidão. Os misteres da família são preenchidos pela mulher e pelos filhos. Açoitar um servo, ou metê-lo em ferros, ou forçá-lo ao trabalho é raro. Costumam matá-los, não por castigo ou por severidade, mas quando arrebatados pela cólera ou assassinam como si se tratasse de um inimigo pessoal, com a diferença, porém, de que o crime praticado contra o escravo não recebe punição.

Os libertos não levam muito mais vantagem do que os escravos: uma ou outra vez conseguem gozar de valia no meio dos senhores. Nas cidades, porém, não lhes assiste nenhuma regalia, salvo naquelas nações governadas por monarcas. Aqui podem mais do que os homens livres e do os próprios nobres. Em todos os outros recantos, a desigualdade dos libertos serve apenas para argumento de liberdade.

XXVII
A prática dos empréstimos, de lucro e de usura é desconhecida entre os germanos, o que lhes aproveita melhor do que qualquer medida coibitiva. As terras cultiváveis são repartidas proporcionalmente ao número dos que as cultivam e, depois, divididas segundo a categoria social dos agricultores, partilha esta evidentemente fácil, pois há vastos tratos de campos que jamais foram plantados. A cada ano mudam de herdade e sempre lhes sobra espaço: porque não procuram aumentar a fertilidade e a quantidade do solo com trabalho e indústria, isto é, plantando árvores, cercando prados e regando as hortas [28]. Contentam-se apenas com que a terra lhes dê grãos e, deste modo, não dividem o ano tal qual nós outros. Conhecem o inverno, a primavera e o verão e sabem-lhes os nomes. Ignoram, porém, o outono e os bens que nos proporciona esta estação.

XXVIII
Seus funerais são simples. Queimam os corpos de seus homens ilustres com uma lenha especial. Não arrojam à fogueira roupas ou perfumes, mas as armas do defunto, e, em alguns casos, seu cavalo. Constroem os sepulcros com céspedes, desprezando o luxo dispendioso de um mausoléu. Logo dão fim a seus lamentos e lágrimas, mas a dor e a tristeza permanecem durante muito tempo. É próprio e conveniente para as mulheres chorar e para os homens recordar. Isso é tudo o que sei da origem e dos costumes dos germanos. Agora darei a conhecer as instituições e maneiras pecualiares de cada povo, além das emigrações daqueles que da Germânia passaram à Gália.

XXIX
O divino Júlio [29], escritor dos mais autorizados, refere que antigamente a superioridade dos galos foi maior e, por isso, é crível hajam eles passado também à Germânia. Que poderoso obstáculo poderia constituir um curso de água [30] à vontade de uma nação dominante que tenha em mira se apossar, nas suas investidas, de regiões abertas a toda gente e ainda não governadas nem defendidas por um soberano que as partilhasse?

Assim, as terras jacentes entre a floresta Hercínia e os rios Reno e Meno foram ocupadas pelos helvécios; e pelos boios [31] as quais demoram no interior, sendo gaulesas ambas estas nações. Perdura ainda na memória das gentes o vocábulo “boiemo”, nome que recorda aquele antigo país, se bem sejam outros, já, os seus habitantes. Não há certeza, porém, se os araviscos emigraram para a Panônia por causa dos osos, nação germânica, ou se os osos para a Germânia por causa dos araviscos, pois ambos estes povos falam a mesma língua e adotam os mesmos usos e costumes, tanto mais que outrora, igualmente pobres e igualmente livres, encontravam numa ou noutra margem (do Danúbio) as mesmas vantagens e as mesmas desvantagens.

Os treviros e os nérvios [32] se jactam da sua origem germânica e a proclamam como se quisessem, pela glória desta ascendência, livrar-se da pecha de covardes que enegrece a reputação dos galos. Os vangiões, os tribocos e os nemetes, habitantes da margem do Reno, são sem dúvida de estirpe germânica. Os úbios, embora também merecido as honras de colônia romana, preferem o apelido de agripinenses, do nome da sua fundadora [33] e não se envergonham da sua progênie. Como atravessassem, desde tempos remotos, o curso do Reno, em virtude pelas muitas provas que deram da sua lealdade (aos romanos) foram colocados naquelas margens, não para serem vigiados, mas para conhecerem os inimigos.

XXX
De todos estes povos os batavos são os mais valentes. Não dispõem de muitas terras à margem do Reno, mas ocupam uma de suas ilhas [34]. Da tribo dos catos, antigamente, passaram, em vista de dissenções domésticas, àquelas terras afim de se tornar integrante do Império Romano. Subsiste ainda a palavra e o testemunho da velha aliança [35] e amizade porque, como não os oprimimos com pesados tributos, não são maltratados pelos fiscais de consumo. Isentos, como estão, de taxas e impostos extraordinários e destinados exclusivamente para os combates, conservá-mô-los da mesma maneira pela qual se conservam os arsenais para a guerra. [36]

Colocamos a nação dos matiacos no mesmo pé de igualdade [37]. O fato é que o esplendor da fama romana ultrapassou o Reno e chegou ao extremo das fronteiras conhecidas. Germânicos não obstante pelo território que ocupam, os matiacos se manifestam romanos pelo sentimento e pelo coração. No demais se assemelham aos batavos: senão pelo clima e pelo solo pelo menos pela ousadia. Não incluirei entre os povos da Germânia, se bem se houvessem estabelecido além do Reno e do Danúbio, os que cultivam os campos “decimados” (decumates agros) [38]. Os mais inconstantes e aventurosos dos gauleses, impelidos pela miséria, foram os primeiros a ocupar aquelas terras de proprietários desconhecidos. Agora que os nossos limites avançaram e levamos mais para longe os nossos pólos militares (praesidiis), este país constitue um prolongamento de Império, isto é, parte de uma província.

XXXI
Mais para além residem os catos [39], cujo país começa na floresta Hercínia e cujas terras são menos planas e menos pantanosas do que as das demais comarcas da Germânia. Colinas que a pouco e pouco se esvanecem, cortam-na de lado a lado. A floresta Hercínia [40] acompanha sempre o território dos catos e com ele acaba também. É, esta, uma gente robusta, de vigorosa compleição, membros reforçados, aspecto feroz e ânimo viril. São (para os germanos) habilidosos e sagacíssimos. Sabem escolher os chefes, obedecer aos que mandam, apreciar a hierarquia, escolher as oportunidades, reprimir o entusiasmo, aproveitar o dia, construir fortificações durante a noite, contar com a sorte duvidosa (fortunam inter dubia) e em meio às incertezas, saber onde reside o valor.

E, o que é raríssimo e não pode ser senão fruto de disciplina é o fato de se ter mais confiança no capitão do que em todo o exército. Toda a sua força reside na infantaria que, além das armas, carrega também víveres e instrumentos de ferro destinados a obras militares. Os outros povos marcham apenas para a batalha: os catos, para a guerra. Não gostam de correrias e evitam as escaramuças. A cavalaria ataca e vence de inopino e também de inopino se retira. A precipitação é companheira do temor; a lentidão, da firmeza.

XXXII
O que entre as nações germânicas é considerado excepcional e somente o realiza algum indivíduo mais afoito, entre os catos já é questão pacífica e todos o adotam por consenso unânime, como por exemplo: o crescimento do cabelo e da barba nos adolescentes e, por motivo de um voto feito ao Valor [41] não podem cortá-los senão depois de terem abatido um inimigo. É sobre o sangue e os despojos do adversário morto que eles descobrem a cabeça e, só assim, julgam resgatada a dívida do nascimento e dignos de seus pais e da sua pátria. Os fracos e os poltrões, medrosos da guerra, conservam este sinal de humilhação. [42]

Os mais destemidos carregam um anel de ferro (o que representa ignomínia aos olhos deste povo) à maneira de grilhão até que mediante a morte de um inimigo possam considerar-se libertados. Os catos em geral adotam esta moda e com este distintivo chegam à senectude, considerado pelos conterrâneos e respeitados pelos adversários. São estes, sempre os que dão início às batalhas e que marcham à vanguarda, cujo espetáculo pavoroso é digno de nota: nem mesmo em tempo de paz lhes desaparece o aspecto horroroso nem se apresentam mais tratáveis. Nenhum deles possui habitação, terras ou quaisquer outros bens que lhes monopolizem os cuidados. Aonde chegam aí se nutrem e se agasalham. Revelam-se prodígios com as posses alheias e menos prezadores do que lhes pertence. Assim atingem a velhice e com ela se reduzem a um estado de não mais poder sustentar tão áspera e rigorosa norma de viver (tam durae virtuti).

XXXIII
Cerca dos catos, onde o Reno já corre caudalosamente e pode servir de limite, habitam os usipios e os tenecteros [43]. Além do seu reconhecido valor militar, os tenecteros gozam de renome de exímio cavaleiros, arma esta que não é menos estimada do que a infantaria dos catos. Instruíram-nos os seus antepassados e os descendentes os imitam. A equitação constitui um dos brinquedos prediletos das crianças, um motivo de competição para os moços e de perseverança para os velhos. No tocante aos bens, compreendido o matrimônio, os cavalos são herdados e se destinam não como outros bens ao primogênito, mas ao que se mostrou mais atrevido na guerra.

XXXIV
Junto dos tenecteros demoravam outrora os bructeros [44]. Assevera-se agora que os chamavos e os agrivários tomaram-lhes o lugar, tendo, de comum acordo com as nações vizinhas, expulsado e destruído os bructeros ou por odiar-lhes o orgulho ou por cobiçar-lhes a riqueza dos bens, ou levados, talvez, por algum favor particular que nos quiseram conceder os deuses. Pois sua bondade nos permitiu contemplar esta peleja: para mais de sessenta mil homens tombaram no campo da refrega, não por motivo da intervenção das armas romanas, mas — para alegria e deleite dos nossos olhos.

Praza aos deuses que, se não obtivermos a amizade daquelas gentes, duradouro seja o ódio recíproco! Pois em face do declínio dos fados do Império nenhum melhor dom nos pôde outorgar a fortuna do que a discórdia entre inimigos.

XXXV
Os agrivários e os chamavos limitam pelo lado oposto com os dulbiginos e os casuários [45], e com outros povos menos conhecidos: os frísios [46] ficam-lhes à frente. Os frísios dividem-se em “maiores” e “menores”, segundo o poder de que dispõem: ambas estas nações se estendem ao longo do Reno até ao Oceano, orlando, além disso, grandes lagos já cortados pelas quilhas das armadas romanas [47]. Outrora tentamos também por aquela rota a exploração do oceano e a fama espalhou por toda parte a existência, ali, das colunas de Hércules [48] ou porque o herói chegasse até aquele ponto ou porque estejamos de acordo em ligar o nome do herói a tudo quanto pareça maravilhoso. Não faltou arrojo a Druso Germânico na investigação daqueles mares: foi o oceano que se opôs à inquirição dos segredos de Hércules. Dai por diante ninguém mais tentou tamanha empresa: houve mais acatamento e reverência no que diz respeito aos deuses — a quem se deve mais crer do que examinar.

XXXVI
Até aqui estudamos a Germânia Ocidental. Para o norte forma uma grande curva. Desde logo topa-se com os chaucos [49], nação que, embora confine com os frisos e possua parte do litoral, vai marginando todas as nações de que falei até lindar com os catos. Os chaucos fazem mais do que ocupar vastíssimas áreas territoriais: povoam-nas. Esta nação é considerada nobilíssima entre os germanos e preferem manter a grandeza mais pela justiça do que pela força.

Vivem quietos e retirados, sem excessiva ambição, amando a existência pacífica, sem se entregar ao roubo e as correrias. O maior argumento de que se valem para pôr evidência as virtudes do que os exornam é o de que a sua superioridade não foi erigida à custa da desgraça alheia. Contudo, as armas não lhes ficam longe das mãos e, em caso necessário, podem equipar um exército porque não lhes minguam nem homens nem cavalos. Na paz gozam o mesmo prestígio.

XXXVII
Ao lado dos chaucos e dos catos, jamais atacados por quem quer que fosse, florescem os cheruscos [50], em longa e nociva paz, que lhes proporcionam mais prazer do que segurança, pois em face de vizinhos tão poderosos quanto insolentes, a calma não tem razão de ser e, uma vez em guerra, o título de moderado e de probo pertence ao vencedor.

Assim, os cheruscos, outrora considerados “bons” e “justos” são tido presentemente na conta de “néscios” e “inofensivos”. Em compensação, para os catos vitoriosos o fator “sorte” se converteu em “sabedoria”. A ruína dos cheruscos arrastou consigo os fosios [51], nação limítrofe, que lhes irmanou na desventura, sem, entretanto, haver partilhado da prosperidade.

XXXVIII
Na mesma região norte da Germânia, nas proximidades do Oceano, se encontram os cimbros [52], atual pequeno povo, mas de excepcional esplendor passado. Encontramos ainda profundos sulcos do seu antigo poderio: numa e noutra margem do Reno vêem-se as ruínas de amplos acampamentos pelas quais se pode avaliar da capacidade, dos recursos e da pujança desta nação e fazer-se uma idéia do que era o seu prodigioso exército. Corria o ano de seiscentos e quarenta da fundação de Roma, quando pela primeira vez se aludiu a guerra dos cimbros, sendo cônsules Cecílio Metelo e Papirio Cardo.

Se contarmos desde então até o segundo consulado do imperador Trajano [53] teremos duzentos e dez anos — tanto é o tempo que levamos para conquistar a Germânia! Em tão longo período, pesadas têm sido as perdas de lado a lado. Nem os samnitas, nem os cartagineses, nem os espanhóis, nem os galos e nem mesmos os partos nos ministraram mais duras lições. É que a liberdade dos germanos geram mais energias do que a monarquia dos arsácidas [54]. Se excetuarmos, pois, a morte de Cássio, que, porventura, nos poderá lançar em rosto o Oriente, que por sua vez perdeu Pacoro [55], um dos seus soberanos e se viu, ao fim, humilhado por Ventídio [56], soldado de Roma?

Ao contrário, os germanos, prendendo ou desbaratando Carbo, Cássio, Scauro Aurélio, Servílio, Cipião e Mânlio, destruíram cinco exércitos consulares ao povo romano e arrebataram a César Augusto e a Varo três legiões completas. Não foi também que sem dano C. Mário os derrotou na Itália; o divino Júlio, nas Gálias; e Druso, Nero e Germânico dentro dos seus próprios domínios. Depois disto, as terríveis ameaças de Caio César se transformaram em ludíbrio [57]. A seguir, veio a paz até que, aproveitando-se das nossas discórdias e da guerra civil, assaltaram os quartéis de inverno de algumas das nossas legiões e se atiraram contra as Gálias, de onde foram expulsos novamente. Em suma, nestes últimos tempos tem sido triunfar sobre eles do que vencê-los. [58]

XXXIX
Os suevos [59] que não formam, como os catos ou tenecteros, uma única nação, mas ocupam a maior parte da Germânia, dividindo-se ainda hoje em povos com diferentes cognomes, muito designados genericamente por suevos. Uma das peculiaridades desta gente consiste em trançar o cabelo e atá-lo com um nó. Por este uso os suevos se distinguem dos germanos e entre eles, os homens livres dos escravos. Nas demais nações este uso não é trivial, a não ser naquelas que ou são aparentados com os suevos ou (como acontece) querem simplesmente imitá-los. Esta moda não vai, porém, além da mocidade.

Entretanto, os suevos conservam até a velhice a crespa guedelha atada para trás e muitas vezes arrematada no alto da cabeça. Os chefes são mais requintados neste particular. Este desavelo, sem embargo, de ataviar-se é neles inocente: não os movem vaidades afeminadas. Arrumam o cabelo, ao entrar em combate, em tufos gigantescos, menos por enfeite do que para atemorizar o olhar do inimigo.

XL
Os semones [60] se dizem os mais antigos e os mais nobres dos suevos, e confirmam isso com sua religião. Em certas épocas do ano, numa de suas florestas, consagrados pelos áugures dos seus pais e por prístinos terrores — “auguriis patrum et, priscà formidine sacram” [61] — congregam-se os povos dessa mesma origem e, sacrificando publicamente um homem, celebram a horrível instituição de um bárbaro rito. Praticam, do mesmo modo, outra superstição em honra desse bosque sagrado: ninguém penetra ali senão algemado como símbolo de sua própria fraqueza e afirmação do poder da divindade. Se por acaso o iniciado tropeça e cai, não tem direito de se levantar e prosseguir: rola por terra. Todas essas superstições têm por objetivo mostrar que ali está o berço da nação e que ali mora o deus dominador de tudo, a quem todos os demais se sujeitam e obedecem. A fortuna dos semones lhes dá essa autoridade: eles habitam cem aldeias e esse grande conjunto tem os suevos como cabeça.

XLI
Os longobardos [62] se orgulham de seu pequeno número. Cercado de numerosos e belicosíssimos povos, encontram segurança não pela magnanimidade dos demais ou por submissão própria, mas por meio de combates em que arrostam perigos. Os reudignos [63] que vêem em seguida, os aviões, os anglos, os varinos, os eudosos, os suardões, os nuitões, todos estão separados e defendidos por florestas e rios. Não há nada a notar neles a não ser o fato de que todos adoram a deusa Hertho [64], isto é, a Mãe-Terra, cuja interferência nos negócios humanos eles acreditam, como acreditam também na visita que ela faz a todos os povos.

Em uma ilha do oceano [65] há um bosque chamado “casto”, dentro do qual existe um coche coberto com um véu dedicado à deusa e que só pode ser tocado pelas mãos de um sacerdote. Este sabe quando a deusa está no santuário e reverentemente acompanha o veículo tirado por uma junta de novilhos. Então há dias de alegria e de festa nos lugares em que a divindade se digna a visitar. São estes os únicos momentos que não consagram à guerra [66]: eles guardam as armas até o instante em que o sacerdote retorna com a deusa, ao templo, farta e cansada da companhia dos mortais. Sem demora, as roupas sagradas, o carro, o véu e, se é lícito acreditar, até a própria deusa, tudo se purifica nas águas de um lago secreto. Os escravos ocupados neste ofício são afogados na própria linfa sagrada. Daí o misterioso terror, a santa ignorância do que possa ser aquilo que só vêm os destinados a perecer.

XLII
Esta parte dos suevos se estende até o coração da Germânia. Mais próximo (para seguir agora o Danúbio como há pouco segui o Reno) se encontra a cidade dos hermonduros [67], gente fiel aos romanos e por isso, excepcionalmente, permitimos que eles comerciem, não apenas nas margens do rio, como os outros germanos, mas até ao interior da região e até mesmo a colônia mais florescente da nossa província da Récia. [68] Andam por onde lhes apraz sem vigilância. [69] Enquanto não permitimos as outras nações ver mais do que as nossas forças armadas e os nossos acampamentos militares, abrimos este povo as portas de nossas casas, das nossas verdades, pois não as cobiçam. No país dos hermonduros nasce o Albis, famoso rio outrora conhecidíssimo pelos romanos, hoje apenas vagamente citado. [70]

XLIII
Ao lado dos hermonduros vivem os nariscos e, mais adiante, os marcomanos e os quados [71]. Os marcomanos superam todos os outros pela força e pelo prestígio. O próprio país em que se instalaram, depois de expulsados os boios, representa uma conquista devida ao seu valor intrínseco. Os nariscos e os quados não lhes cedem passo. Esta é como a fronteira da Germânia, na parte banhada pelo Danúbio. Os marcomanos e os quados conservaram até o nosso tempo reis naturais da sua própria raça, da ilustre casa de Maroboduo e de Tudro [72]. Hoje são governados até por estrangeiros. A força e o poder destes reis, entretanto, provêm da autoridade e da proteção de Roma [73]. Escassamente os ajudamos com nossas armas: com o nosso dinheiro muitas vezes. Contudo, nem por isso são menos poderosos.

XLIV
Mais além, os marsignos, os gotunos, os osos e os búrios [74] formam na retaguarda dos marcomanos e dos quados. Vê-se pelo trajo e pela língua que os marsignos e os búrios descendem dos suevos. O gálico falado pelos gatunos e o panônico pelos osos e, sobretudo, a resignação com que aceitam o peso dos tributos, provam que este povo nada apresenta de comum com os germanos. Parte destes tributos lhes é imposta pelos sármatos [75] e parte pelos quados, que os tratam como estrangeiros.

Os gotunos, para cúmulo da humilhação, trabalham nas minas de ferro. [76] Estas tribos habitam mais o seio das florestas e o dorso das serranias do que as planícies. Saiba-se, pois, que a região dos suevos é separada e cortada por uma cadeia contínua de montanhas, além das quais habitam vários povos de que os lígios [77], ocupando numerosas cidades, representam a porção mais considerável. Basta citar os principais: os ários, os helveções, os manimos, os elísios e os naharvalos. [78]

No país dos naharvalos existe um bosque consagrado por antigo culto. As cerimônias são presididas por um sacerdote vestido de mulher. Acreditam os romanos que ali se adoram os deuses Castor e Pólux, sob a invocação dos Alcis. Neste sítio não se vêem imagens nem vestígios de superstição estrangeira. Veneram somente dois irmãos jovens. Entretanto, os ários não são apenas superiores em força aos demais povos citados: são também cruéis e exageram a natural ferocidade ajudados pelo artifício e pelo tempo: usam escudos negros, pintam o corpo [79] e preferem para os combates as noites mais escuras. O espanto e o assombro causado por este lúgubre exército bastam para intimidar o inimigo que, em absoluto, consegue suportar este infernal espetáculo, porquanto as primeiras vítimas ao encetar-se a peleja, são logo os olhos.

XLV
Como os lígios, os gotunos são governados por monarcas e, embora se sintam um pouco mais sujeitos do que os outros povos germânicos, não perderam de todo a liberdade. Na costa do oceano habitam os rúgios e os lemóvios [80]: todas estas gens se distinguem pelos escudos redondos e pelas espadas curtas que ostentam, bem como pela obediência que prestam aos reis. Seguem-se-lhes, imediatamente, ao longo do mesmo oceano, as cidades dos suiões, poderosíssimos não só em exércitos mas também em esquadras. [81]

A configuração dos seus navios difere em que, armados de duas proas, podem sempre abordar de frente. Não navegam com velas nem dispõem os remos por ordem, na borda das embarcações: usam-nos soltos, como freqüentemente se adotam nos rios, e, de acordo com as circunstâncias, mudam de um para outro lado. As riquezas materiais são apreciadíssimas, razão por que se submetem a um chefe que, sem restrição alguma, exerce uma autoridade e um direito que nada tem de precários.

As armas, aqui não estão como entre os demais germânicos, à disposição de qualquer pessoa: mas guardadas sob a responsabilidade de um escravo, pois o oceano os coloca ao abrigo de qualquer surpresa. Na verdade, as armas nas mãos de uma tropa inativa geram quase sempre tumulto e desordem. Não convém, demais, a um soberano entregar a custódia dos arsenais a um nobre, a um homem livre ou a mesmo a um liberto.

XLVI
Para lá dos suiões encontra-se outro mar tranquilo, quase imóvel [82], que, segundo se acredita, forma a cintura e o limite do mundo, porque nela a última claridade do crepúsculo se prolonga até a aurora, tão lúcida que amortece o brilho das estrelas. A credulidade acrescenta que se ouve o estrondo quando o Sol sai e que se vê os raios de sua cabeça e figuras de deuses. Ali é certo que acaba a Natureza. [83]

À direita do mar suevo se estende pela costa o povo dos éstios, [84] que, por seu costume e vestimentas assemelha-se muito aos suevos, e por sua língua aos bretões. Veneram a mãe dos deuses, e têm figuras de javalis como sinal de sua religião, [85] que levam em lugar das armas para sua defesa e se apresentam no meio de seus inimigos confiantes na devoção à sua deusa. Usam pouco o ferro e muito os cajados. Cultivam o trigo e outras espécies de grãos com muito mais cuidado e paciência do que é comum entre os germanos. São os únicos que buscam o âmbar - que chamam de gleso - [86] nas praias e no fundo do mar. Como bárbaros que são, não se preocupam em averiguar qual é sua natureza e como se forma. Durante muito tempo ele se encontrava em jazidas costeiras como outros restos do mar, até que nosso luxo o tornou precioso. Eles não o utilizavam, colhendo-o a esmo e transportando-o sem refinar. Por fim, assombrados, perceberam sua importância.

Calculo que se trata do humor de alguns arbustos, [87] porque transparece no âmbar, amiúde, animáculos e até insetos [88] que, tendo aderido ao licor, ficaram presos ali ao se transformar em massa consistente. Sou propenso a crer que, como em certas partes remotas do Oriente dão o incenso e o bálsamo, também nas ilhas eternas do Oriente existem árvores de selvas e bosques fertilíssimos, cujos licores secados pelos raios do sol vizinho venham a cair no mar que as banham e de onde a violência das tempestades os arroje a outras praias contrapostas. Se, para lhe conhecermos a natureza íntima, aproximarmos o âmbar do fogo, vê-lo-emos inflamar-se como um archote e produzir uma chama grossa e cheirosa em seguida, transforma-se em gelatina, como o pêz ou a resina. A nação dos sitões [89] se prolonga até aos suiões. Em tudo se assemelham eles aos demais povos, exceto nisto: são dirigidos pelas mulheres. Assim, não só degeneraram em relação à liberdade, mas também em relação à própria escravidão. Aqui acaba a Suévia.

XLVII
Tenho dúvidas se devo incluir entre as nações germânicas ou se entre as sármatas, as tribos dos peucinos, dos venedos e dos fenos, [90] se bem que os peucinos, também chamados bastarnas por alguns, sejam na linguagem, no trato e no modo de habitar quase idênticos aos germânicos. Em todos, porém, a sordidez e a preguiça representam o denominador comum (sordes omnium ac torpor). No respeitante aos chefes a mistura de sangue com os sármatas, pelos casamentos realizados, deu-lhes um pouco da fisionomia selvagem e da maneira de vida desta tribo.

Os venedos herdaram muito dos seus costumes, pois as florestas e os montes que se erguem entre os teucinos e os fenos, os venedos trilham e pilham se cessar. Contudo, costumam estes ser reconhecidos como germanos; sabem edificar, fabricam escudos, andam a pé e são agilíssimos. Em tudo isto diferem dos sármatas, que se locomovem de carro e a cavalo. É espantoso o grau de barbárie e o estado de miséria dos fenos: não possuem armas, nem cavalos, nem moradas. Alimentam-se de ervas, vestem-se de peles e dormem na terra nua. Todos os seus recursos residem nas frechas que, na falta de ferro são armadas de ossos pontiagudos. A caça sustenta homens e mulheres. Como estas não abandonam os maridos este mister venatório, exigem parte da presa.

As crianças não conhecem outra espécie de abrigo contra as feras e as tempestades além da choca feita de galhos entrelaçados. Servem elas também de refúgio para os moços e de asilo para os velhos. Encontram neste estilo de existência mais felicidade do que poderiam encontrar no amanho da terra, na laboriosa construção de casas ou em colocar entre esperanças e ameaças, o destino e os bens da sua ou das demais nações. Seguros da parte dos homens e seguro da parte dos deuses, alcançaram esta coisa dificílima: não sentir sequer a necessidade de desejar. Tudo o mais que se conta a respeito deste mundo é fabuloso, como por exemplo: que os helúrios e os oxionas apresentam feições e rosto de homem e corpo e membro de feras. [91] Como isto, porém, não está averiguado, ponho de lado o assunto.

*

Notas

[1] Germânia (trad. e notas de Sadi Garibaldi). Rio de Janeiro: Editora Livraria Para Todos, 1943. Essa tradução foi confrontada com CAYO CORNELIO TÁCITO. Obras completas (traducción, introducción y notas. Obra publicada bajo la dirección de VICENTE BLANCO Y GARCÍA). Madrid: M. Aguilar Editor, 1946, p. 1011-1044.

Tácito, nascido provavelmente na Gália Narbonense em 56/57 d. C, escreveu esta obra em 98 d. C. Era considerado um dos oradores mais importantes de Roma em seu tempo. Germania é uma monografia histórica e etnográfica onde o autor percebe a ameaça dos germanos pela sua forte noção de libertas (liberdade, inexistente em Roma), bem como pela coragem (virtus).

[2] Os antigos compreendiam, sob o nome da Germânia, não apenas o país que forma hoje a Alemanha, mas ainda a Dinamarca, a Suécia, a Noruega, a Lituânia, a Letônia, a Estônia, a Finlândia, etc. A Récia ocupava o país dos Grisões com uma parte da Suábia e da Baviera.

[3] “Golfos espaçosos”: o golfo da Riga, da Finlândia, de Botnia. “Vastas ilhas”: a Suécia, que os antigos acreditavam fosse uma ilha e as ilhas da Dinamarca. Os Alpes Récios são hoje as montanhas dos Grisões, o monte Abnoba e a Floresta Negra.

[4] Atual Mar Negro.

[5] Os antigos estavam persuadidos de que o globo terrestre elevava-se para o norte e que, assim, para navegar pelo Oceano Setentrional tornava-se necessário remontar o curso d’água.

[6] Os ingevões eram povos germânicos estabelecidos nas costas do Mar do Norte, desde o país dos batavos até a Península dinamarquesa. Herminões é o nome genérico dado aos povos habitantes do interior das terras, e particularmente, da Alemanha central. Enfim, sob o nome dos istevões designam-se os povos estabelecidos na Renânia. Estes três nomes se ligam aos três filhos de Mann: Itgo, Ermn e Isto, que não são outros senão os sobrenomes dos três deuses Freyr, Tin e Wodan.

[7] Terror que causavam aos galos.

[8] Wehr — menn ou Germann, que eles pronunciavam. GUERRE — MAIN, e significa “homem de guerra”.

[9] Denominação greco-romana dos deuses THOR ou DONAR, que desencadeava a tempestade e brandia um martelo de pedra, da mesma forma que o deus grego empunhava a maça.

[10] Os romanos, como se depreende das Historias de Tácito, também tinham os seus bardito.

[11] Asciburgio = atual cidade de Asburgo.

[12] Nóvica = Baviera e Áustria.

[13] Panônia = atual Hungria.

[14] De pequenos cornos.

[15] Serrat nummi: vinheiro de prata, cuja borda era dentada, à maneira de serra; Bigatus nummces: denário de prata com a efígie de uma Vitória num carro puxado por uma biga.

[16] O capacete de metal (cassis) era o da cavalaria romana e o de couro (galea), da infantaria.

[17] Vespasiano (9-79 d.C.), imperador (69-79 d.C.).

[18] Nave libúrnia (do latim liburna) - A nave libúrnia era uma embarcação utilizada pelos romanos no início da era cristã para o transporte de trigo do Egito para Roma.

[19] A palavra sorte designava os objetos usados para decidir alguma coisa por meio da adivinhação.

[20] Chefes da aristocracia germânica, revestidos de autoridade judicial, religiosa e militar.

[21] Encontra-se aqui a origem da tradição da antiga cavalaria medieval de cingir a espada ao que se arma de cavaleiro.

[22] A toga que os romanos envergavam a partir dos dezessete anos.

[23] Os jovens aristocratas, companheiros de um príncipe.

[24] O Mar Ártico.

[25] Isto é, a parte mais oriental do Mar Báltico.

[26] Provavelmente é daí que provém a expressão “escravo da sua palavra”.

[27] Isto é, os que têm origem diferente.

[28] Tácito quer dizer que os germanos não trabalhavam a terra, isto é, não a adubavam para produzir mais do que poderia dar sua natural fertilidade.

[29] Caio Júlio César (100-44 a.C.), autor dos Commentarii.

[30] O Reno.

[31] Os boios habitavam o Bourbonais; os araviscos, o Palatinavo; os pilos, a Baixa-Hungria; os osios, o ducado de Oels, na Alta-Hungria.

[32] Os treviros ocupavam a antiga diocese de Trèves; os nérvios, em Cambresis e no Hainaut; os vengiões estavam estabelecidos na margem esquerda do Reno com Borbetomagus (Worms) por capital; os tribicos habitavam a planície da Alsácia; seu núcleo principal era Breucomagus (Brumath); os nemetes, cujo nome parece céltico (“habitantes do bosque sagrado”) residiam no vale do Novismagus (Spiro).

[33] Agripina, a Jovem (15-59 d.C.), sobrinha e mulher do imperador Cláudio (10 a.C.-54 d.C.).

[34] A ilha formada pelo Reno, Vahal e Mosa.

[35] Isto é, da aliança com os romanos.

[36] Compreende-se toda espécie de ofensiva e defensiva, porque no original se lê: tela atque arma.

[37] Os matiacos se estabeleceram principalmente ao sul do Taunos, nos vales do Mosa e do Reno. As fontes de Wiesbadem se chamavam “fontes Mattiaci”, ou aquae Mattiocae. Os matiacos ocupavam uma parte da Weteravia, uma parte de Hesse, do país de Isemburgo e do Fulde. Este nome se encontra um pouco adulterado no de “Magpurg”, cidade deste cantão.

[38] Que pagam dízimo dos frutos reservados para a gente guerreira e de que não podiam gozar os inimigos.

[39] De acordo com alguns comentadores, catti e hassi são a mesma palavra. O país dos catos ou hassos era em grande parte o que depois se chamou Hesse. Na parte da Holanda onde o Reno se perde nos areais, há um burgo denominado Catwik que, acredita-se, seja uma antiga povoação dos catos, Cattorum Vicus.

[40] O “Valor”, personificação da divindade.

[41] “Valor” entende-se aqui mais uma vez como uma entidade personificada.

[42] Os romanos, que usavam o cabelo cortado e a barba feita, consideravam aquele costume bárbaro falta de asseio.

[43] Os usipios ocupavam, ao que parece, o ducado de Cleves, além do Reno e uma parte do Munster. Os tuncteros estavam radicados no antigo ducado de Berg e no ducado de Mark.

[44] Os bructeros ocupavam a Westfália e o país de Overissel, isto é, entre o Ruhr, o Lipo e o Ems. Os chamavos, a região de Osnaburgo; os agrivários, o principado de Mindem e o condado de Schawenburg.

[45] Nada há de preciso a respeito da região ocupada outrora pelos dulbiginos e pelos casuários: habitavam cerca das nascentes do Lipo e às margens do Weser.

[46] Os frísios, divididos em “grandes” e “pequenos”, se localizavam nas costas do Mar do Norte, do Lago Flevo ao Ems.

[47] Nos anos 12, 13 e 16 de nossa era, isto é, durante as campanhas de Druso e Germânico.

[48] Estreito de Gibraltar.

[49] Os chaucos estavam estabelecidos na comarca compreendida ao este, entre o curso inferior do Elba e o do Weser e a oeste, entre a embocadura do Weser e do Ems.

[50] Entre o Elba e o Weser.

[51] Nenhum autor contemporâneo além de Tácito fala dos fosios.

[52] Chamava-se ainda o país do “Kersoneso Címbrico”: o Hotein, a Jutlândia e o antigo ducado de Sleswik.

[53] No ano 98, data em que foi escrito este livro.

[54] De Arsace, fundador da monarquia dos partos, após a ruína da dominação macedônica.

[55] Filho de Orodo, rei dos partos: assassinado por Ventídio em pleno campo de batalha, no ano 37 a.C., no mesmo dia em que, quinze anos antes, Crasso foi massacrado.

[56] Antigo mercador de bestas e fornecedor de guerra durante as campanhas de César nas Gálias. A proteção do general o elevou a cônsul, no ano 44 a.C.

[57] Esta frase alude a muitos fatos. Primeiro, a batalha de Verceil ganha por Mário contra os cimbros em 101 a.C. Depois, as campanhas de César contra Ariovisto, contra os belgas, contra os usipos e os tencteros, contra os sicambros e os suevos (de 58 a 53 a.C.). Também as expedições de Druso, de Tibério e de Germânico na Germânia (de 12 a.C. a 16 d.C.). Por fim, a ridícula empresa de Calígula (37 d.C.?). Consulte Suetônio (As vidas dos doze Césares).

[58] Alusão à revolta de Batavo Civilis.

[59] Os suevos se estendiam pelo país imenso que ficava entre o Elba, o Vístula, o Báltico e o Danúbio. Este nome ainda se conserva no de Suábia, região que os marcomanos, povo também suévico, habitavam antes de terem passado para a Boêmia.

[60] Os semones ocupavam uma parte da Pomerânia, do Brandeburgo e do Lusaco, isto é, entre o Elba e o Oder.

[61] “Consagrado pelos áugures dos seus pais e por um antigo terror”: o verso de Virgílio que, naturalmente, foi citado de memória por Tácito é este: Relligione patrum et prisca formidine sacram.

[62] Assim chamados em virtude de sua barba crescida. Acredita-se que habitavam entre o Mittelmark, na parte do antigo ducado de Magdeburgo, além do Elba.

[63] Destes sete povos, os três últimos são inteiramente desconhecidos. Os quatro restantes viviam nos arredores de Slesnoick e no país ainda chamado “Anglen”.

[64] Na língua anglo-saxônica hearth, ainda significa “terra”.

[65] É possível que Tácito se refira nessa passagem à ilha de Rugen; ali existe um profundo lago que foi objeto de superstição daqueles povos.

[66] A Paz do Senhor, tantas vezes proclamada pelo clero no século XI, é outra forma histórica desse antigo costume.

[67] Os hermonduros ocupavam o antigo principado de Anahalt, o Voitland, o Saxe e uma parte da Mísnia e da Francônia.

[68] Augusta Vindelicorum, em Augsburgo-sobre-o-leste.

[69] Isto é, sem estarem submetidos à vigilância romana.

[70] Parece que Tácito confundiu o Elba com seu grande afluente da margem esquerda, o Saale, que nasce na Turíngia, no Fichtelgebirge, pois o Elba origina-se nos Montes Gigantes.

[71] Os nariscos ocupavam a parte da Baviera que fica entre a Boêmia e o Danúbio. Os marcomanos, a Boêmia, os quados, a Morávia, e parte da Áustria, compreendida entre o Danúbio e a Morávia.

[72] Maroboduo foi rei dos marcomanos e depois aliou-se aos romanos contra Armínio, como se depreende nos Anais de Tácito (II, 46). A respeito de Tudro, nada se sabe.

[73] Em seus Anais, Tácito nos informa que a política dos romanos visava, antes de tudo, converter os reis de diferentes nações em instrumentos de sua própria ambição.

[74] Os marsignos se localizavam nos arredores de Glatz, de Jegendorf e de uma parte da Silésia, abaixo dos marsignos, e uma parte da Hungria; os osos, a parte da Hungria que se estende até ao Danúbio e que fica sob os gotunos; os búrios, o monte Krapach e as nascentes do Vístula.

[75] Sob o nome de sármatas os antigos compreendiam todos os povos habitantes da Polônia e da Rússia do oeste e do sul.

[76] Para bem se compreender o pensamento de Tácito é preciso recordar a resposta de Sólon a Creso, rei da Lídia: “O povo que tem ferro deve mandá-lo ao que somente possui ouro.”

[77] Os lígios estavam estabelecidos na Silésia, na Prússia e na Polônia, sobre as margens do Vístula. Faziam parte dos sármatas.

[78] Os ários, como já dissemos, habitavam o curso superior do Oder; os helveções, entre o Oder e o Vístula, bem como os manimos, os elísios e os naharvalos.

[79] O costume de pintar o corpo era geral em todas as nações selvagens. Júlio César disse que os britanos pintavam o corpo, o que os tornava “horríveis quanto à pele”.

[80] Os rúgios radicavam-se nas margens do Báltico. O nome desta tribo revive ainda no da pequena cidade de Rugenwald, bem como na ilha de Rugen. Os lemóvios, germânicos, residiam onde é agora Stolpe, Lavenburgo e Dantzig. Os suiões eram senhores da Suécia e das ilhas da Dinamarca.

[81] O que Tácito revela aqui a respeito da marinha dos suiões constitui uma antecipação dos prodigiosos armamentos que, cinco ou seis séculos após, eles iriam fabricar para usá-los nas suas novas invasões e novas pilhagens.

[82] Tácito parece aludir ao mar Báltico e aos golfos da Finlândia e de Botnia, que, por causa do gelo, é impraticável durante o inverno. Quanto ao fulgor do sol, ninguém ignora que nos climas do norte, em algumas latitudes, o sol domina o horizonte durante vinte a quatro horas. Em outras, mais ao norte, um mês inteiro e no pólo, seis meses.

[83] “A natureza termina ali”: os antigos acreditavam que o oceano era o limite extremo do mundo e que além daquele conhecido deles não havia outros.

[84] O mar suévico é o Báltico. Os éstios eram oriundos da Prússia ocidental e das províncias bálticas.

[85] É curioso observar como entre os germanos se espalhava a mesma superstição relativa aos amuletos que tanta voga adquirira na Grécia e em Roma e cujo prestígio ainda se conserva entre muitos povos.

[86] Plínio dá também ao âmbar ou succinum o nome de glesum e observa que se encontra em abundância nas ilhas do Mar do Norte e com especialidade em uma conhecida pela designação de Glessaria.

[87] A ciência moderna confirma em grande parte as opiniões de Tácito. O âmbar amarelo (succinum) se encontra principalmente nas costas do Mar Báltico e provém de uma conífera (pinitas succifer), cujas células e raios medulares estavam cheios de succinum. Esta planta, porém, não sobreviveu ao mundo antediluviano.

[88] Behrendt conta mais ou menos seiscentas espécies destes insetos, na maior parte desconhecidos na Europa setentrional.

[89] A atual Noruega.

[90] Os peucinos, que Plínio chama de bastarnos, ocupavam na Germânia oriental as imediações da ilha (hoje Piczina) formada pelos braços do Danúbio nas proximidades do Mar Pôntico (Mar Negro). Os venedos habitavam a Samogicia e a Lituânia. Os fenos são antepassados dos finlandeses e dos suecos atuais.

[91] Tácito se refere aos habitantes da Lapônia. Hoje se julga que isso deu lugar à fábula por ele enunciada: o traje daqueles povos que, vivendo nas regiões do gelo e da neve, se cobre com os despojos dos animais que matam na caça e que lhes fornece alimento e vestido, por isso, mais se parecem com feras do que com criaturas racionais.

quinta-feira

Democracia

segunda-feira

"Deixe um pouco de lado sua busca por conforto e ouça a voz
do sangue que você carrega. Esqueça o prazer egoísta que
fundamenta cada ato seu, abandone os vícios, pare tudo o que esteja
fazendo de inútil, deixe de dar atenção aos seus algozes sutis e, por
um instante que seja, escute o que ele tem a dizer. Este sangue que
chegou até você através dos seus pais, seus avós, foi testemunha
viva de crimes cometidos contra sua raça, contra nossa raça, e é uma
ponte que nos liga às origens da criação e além! É a materialização
do espírito, e a única forma de elevação se encontra na sua pureza.
O seu sangue é sua razão de ser, dele nasce a consciência, por ele a
resistência e a luta e através dele a salvação. Este sangue viu os
deuses serem mortos e os espíritos serem aprisionados, ele
viu a fé niilista do oriente substituir, a custo de morte e
traições, nossa fé ancestral, e desonrar nossos deuses e nossa
religião e mais! Ele viu as fogueiras serem acesas por nossa
própria gente, enfeitiçada pelo falso Cristo, ele ouviu os gritos e as
maldições na hora da morte, ele viu os assassinos rezarem e serem
santificados por seus crimes, seu sangue viu a verdade quando o Rei
do Sangue foi guerreado pelo mundo inteiro, controlados pelas
garras da Sinarquia, o seu sangue presenciou a injustiça e conheceu
a face dos criminosos. Se você deixar um pouco de lado suas
ambições mesquinhas e permitir ao seu sangue se fazer ouvir, tudo
mudará, pois, ser humano algum, dispondo de um mínimo de
dignidade e caráter, permanecerá indiferente aos gritos dilacerantes
de milhões de mortos exigindo vingança. Em cada gota do seu
sangue há um espírito pedindo justiça, há um velho homem que
civilizou o mundo, que tornou a vida melhor e que solucionou os
problemas que pôde em nome da humanidade, que teve seu nome e
sua memória vilipendiados pelos corruptos e corruptores. Ouça seu
sangue, reviva os seus deuses, vingue seus mortos e eleve o seu
espírito a Hiperbórea!"


Nogaret

quarta-feira

Joseph Goebbels - NOSSO HITLER

Meus compatriotas! Homens e mulheres! Há dois anos, em 20 de Abril de 1933, quando Adolf Hitler apenas levava escassos três meses no poder, pronunciei pelo rádio uma alocução ao povo alemão, durante a ocasião do aniversário do Führer. Assim como então, tampouco é hoje minha intenção dar leitura a um artigo editorial ardente. Deixo isto aos mais aptos a este estilo. Tampouco é meu desejo efetuar uma apreciação à obra histórica de Adolf Hitler. Pelo contrário, hoje, no dia do seu aniversário, creio que tenha chegado o momento de por diante dos olhos de todo o mundo o ser humano Hitler, com toda a magia de sua personalidade, com a força misteriosa e penetrante de sua atuação individual.

Possivelmente já não há ninguém no vasto globo que não o conheça como um homem de Estado e grandioso condutor do povo. Mas somente a poucos lhe é concedido vê-lo diariamente desde a proximidade mais imediata como ser humano, ter essa vivência e, quisera agregar, aprender a compreendê-lo e amá-lo justamente por ele ser tão profundo. A esses poucos também somente se lhes revela o milagre do por que e como foi possível que um homem que há apenas três anos ainda tinha a metade do povo contra si, e que na atualidade vê os seus compatriotas estarem acima de todas as dúvidas e críticas. Porque se a Alemanha encontrou em algo uma unidade que jamais pode ser comovida, é na convicção de que Hitler é o homem do destino, que leva em si a vocação de voltar a conduzir a Nação, desde o desenvolvimento interior mais terrível e de uma infame humilhação política exterior, para a ansiada liberdade.

O fato de que um homem, ao realizar esta obra, que às vezes também requereu decisões muito duras e impopulares e que mesmo assim, tenha estado junto ao coração de todo um povo, é, talvez, o mistério mais profundo e milagroso de nosso tempo. Não se pode explicar unicamente pela obra puramente objetiva; porque precisamente aqueles que brindaram os sacrifícios que deveriam, sentiram de modo mais profundo e feliz sua missão, professando-lhe o amor mais sincero e ardente como Führer e homem. Este é o resultado da magia de sua atuação pessoal e de sua humanidade pura e fiel.

Desta humanidade, tal como se revela de maneira mais límpida a aqueles que lhe estão mais próximos, falaremos nesta ocasião.

Como toda humanidade genuína, assim também esta é sincera e clara no ser e na ação. Isso se evidencia tanto nas coisas menores como nas maiores. A clareza sincera que se incorpora em sua imagem política é também o princípio dominante de toda sua vida. Não teria sido de outro modo e se assim o fosse, seu povo não o reconheceria. Seu cardápio cotidiano é o mais simples e modesto que se possa imaginar. Não varia em sua apresentação, quer se encontre na mesa com somente seus mais íntimos amigos, quer como um importante convidado. Quando há pouco, em oportunidade de recepção aos Hauwalter da Winterhilfswerk, um antigo membro do Partido lhe solicitou depois do almoço que lhe autografasse um cardápio como recordação. Hitler titubeou um instante e disse sorrindo: "Faça o mesmo. Para nós, os cardápios nunca são incrementados e qualquer um pode tê-los à vista”.

Adolf Hitler é um dos poucos chefes de Estado que à parte de uma única alta distinção que obteve na guerra por um valor pessoal máximo, como simples soldado, nunca leva ordens nem medalhas honorificas. Isto é uma prova de reserva, mas também de orgulho. Não há sob o sol nenhum homem que pudesse distingui-lo fora de si próprio. Toda falta de oportunidade lhe desagrada; mas, ali onde deve representar o Estado e a seu povo, faz a tudo com tranqüila dignidade.

E por trás de tudo o que é e se faz, está o conceito que o grande soldado Schlieffen expôs em sua obra: "Ser mais do que parecer!". A ele se une uma laboriosidade e uma tenacidade na perseguição das metas fixadas que se sobrepõem amplamente à força humana comum. Quando há poucos dias voltei a me encontrar novamente em Berlim, a uma da manhã, depois de duros dias de trabalho, e quis retirar-me para descansar; todavia, fui chamado à sua presença, a fim de apresentar um informe, e às duas da manhã, Hitler ainda falava em seu domicílio, sem dar mostras de cansaço, estando em plena tarefa. Logo, ele solicitou que se fizesse uma exposição que se estendeu em quase duas horas, sobre as construções das pistas do Reich, tema que, como se pode ver, aparentemente estava por completo à margem dos grandes problemas da política exterior dos que se havia ocupado todo o dia, desde a madrugada até a entrada da noite.

Antes do último Dia do Partido de Nuremberg, tive o privilegio de ser seu hóspede durante uma semana em Obersalzberg. Entre a noite, até 6 ou 7 da manhã, saía um resplendor de luz de sua janela: o Führer ditava os grandes discursos que pronunciaria uns dias mais tarde, no Congresso do Dia do Partido. No Gabinete, não se aprova nenhuma lei que ele não tenha analisado até seus últimos detalhes. Ele é o especialista militar da mais alta preparação; toda peça de artilharia e toda metralhadora passam por suas mãos, pois ele as conhece como um perito; é como estar em uma exposição, pois ele está familiarizado em todos seus pormenores.

Seu modo de trabalho está orientado à clareza completa. Nada lhe é mais estranho que o apuro nervoso e a hipertensão histérica. Ele saber melhor que qualquer outro que há centenas de outros problemas a serem resolvidos. No entanto, ele escolhe a dois ou três de maior importância e assim, não se deixando influenciar para solucioná-los pela gravidade dos restantes, ele reconhece que apenas com a segurança das questões mais simples é que os outros problemas se resolvem por si só.

Ao atacar os problemas, mostra, por um lado, a dureza que é necessária para impor os critérios fundamentais, e, por outro, a elástica flexibilidade que é indispensável no emprego dos métodos. O Führer é tudo menos alguém repleto de princípios jactancioso e adorador de esquemas; no entanto, nem seus princípios ou esquemas jamais foram insuficientes, pois ele os aborda de uma maneira que os faz duradouros e soberanos. Suas metas nunca são mudadas. O que faz hoje é o que ele havia dito em 1919. Mas mutáveis foram sempre em correspondência com as situações de cada caso, mudando os métodos que pôs em ação para a consecução de seus fins. Quando em agosto de 1932 lhe foi oferecida a vice-chancelaria, declinou rotundamente com palavras lacônicas e secas. Ele tinha a convicção de que o tempo ainda não estava maduro e que o sonho no qual se queria colocar aparecia como demasiado estreito para permanecer parado sobre ele. Quando o 30 de janeiro de 1933 abriu-lhe uma porta a mais ao poder, transpassou-a valentemente, ainda que não estivesse submetido a toda responsabilidade; porque ele sabia que a base sobre a qual agora estava parado, era suficiente como para começar desde ali a luta pela totalidade do poder. Os sabichões não queriam entender nem a um nem a outro; hoje, no entanto, pedem-lhe humildemente por seu perdão, porque não somente os superou na tática senão também na condução estratégica dos princípios em cujos defensores se haviam erigido em miopia prepotente.

No verão passado, circularam pela imprensa dois retratos que representavam o Führer em toda sua solidão, de maneira mais comovedora possível: o primeiro o mostra ao dia seguinte do 30 de junho, quando teve de lavar com sangue a traição e o amotinamento, saudando ao público da janela da Chancelaria do Reich, a Reichswehr. Seu rosto quase petrificado pela dilacerante amargura das difíceis horas que acabava de viver. O segundo, depois de sua última visita ao agonizante Generalfeldmarschall, ao abandonar a casa do Presidente do Reich em Neudeck. O rosto assombrado, tomado pela dor e a tristeza diante da morte implacável que dentro de poucas horas arrancara seu amigo paternal. Com dom quase profético, ele nos havia previsto em intimidade os graves perigos do ano de 1934 já em uma noite de Ano Novo, assinalando, assim mesmo, que possivelmente neste ano Hindenburg nos seria arrancado. Logo isto ocorreu. E no rosto endurecido de um solo se expressava, não lamentando, mas estando chateado com a dor de todo um povo.

Todo esse povo adere a ele não somente com veneração, mas com um amor profundo e cordial, porque tem a convicção de que também Hitler pertence a ele, que é carne de sua carne e espírito de seu espírito. Isto se expressa inclusive nas coisas menores e mais fúteis da vida diária. Impera na Chancelaria do Reich, por exemplo, uma camaradagem respeitosa que é reservada do mesmo modo até ao último homem SS do comando de escolta com o Führer. Quando viaja, todos vivem no mesmo hotel e em condições idênticas. É de estranhar, pois, que justamente a gente mais humilde lhe seja adepta mais fielmente? É que tem o convencimento instintivo de que isto, longe de estranhar uma postura artificial é a conseqüência espontânea de um modo de ser bastante natural.

Há algumas semanas, cerca de 50 jovens alemãs do exterior, que passaram um ano realizando cursos na Alemanha do Reich e deviam retornar à sua pátria de sangue, solicitaram na Chancelaria vê-lo por alguns minutos. Ele as convidou para entrar e durante horas tiveram de maravilhar com a vista das pequenas casas e vistas modestas. Ao despedirem-se, entoaram repentinamente a canção "Wenn alle untreu werden" e as lágrimas brotaram de seus olhos. Em meio a elas todas, estava em pé o homem que havia chegado a ser a quintessência da Alemanha eterna, quem teve amáveis e bondosas palavras de consolo para que as acompanhassem em seu difícil caminho.

Do povo veio e nele permaneceu. O que durante dois dias em conferência de quinze horas com os estadistas da Inglaterra dominadora do mundo, em diálogo afilado e com um domínio magistral dos argumentos e das cifras, negocia sobre as questões que fazem o destino da Europa, fala com a mesma naturalidade lógica à gente do povo e mediante um "tu" de camaradagem da guerra, que se adianta com o coração palpitante e que talvez durante dias, formula a pergunta de como haveria de dirigir-se a ele e que é o que deveria lhe dizer. Mesmo os menores lhe acercam com alegre confiança, porque sentem que é seu amigo e protetor. Todo o povo o ama porque em suas mãos se sentem protegidos, como um filho nos braços da mãe.

Este homem está fanaticamente possuído por sua casa. Sacrificou-lhe sua felicidade e sua vida privada. Para ele, não existe outra coisa senão sua obra, que o absorve por completo e a ela, ele serve, com humildade interior, tal qual o mais fiel trabalhador do Reich.

Um artista se converte em homem de Estado, e em sua reconstrução histórica se revela novamente sua mais alta capacidade artística. Ele não necessita honras exteriores; ele as honra na forma mais persistente e imperecível sua própria obra. Mas nós, que temos de estar diariamente próximos dele, recebemos a luz de sua luz e a coluna que é guiada por suas bandeiras; queremos ser somente seus seguidores mais obedientes. Freqüentemente diz-se nesse pequeno circulo de seus combatentes mais antigos e de aqueles que gozam de sua maior confiança: "Terrível será o dia em que o primeiro de nós morrer e cair em um vazio, em um lugar onde não se possa levar". Que um ato bondoso ainda permita que seu lugar esteja ocupando o maior tempo e que ainda durante muitos decênios sua Nação sob sua condução, que possa prosseguir o caminho para a nova liberdade, grandeza e poder. Este é o desejo mais sincero e ardente que hoje todo o povo alemão põe a seus pés, em sinal de gratidão. E assim como nós, que estamos reunidos estreitamente ao seu redor, diz nesta hora o último homem na aldeia mais remota: "O que foi, o é; e o que és, continuarás sendo: Nosso Hitler!".

domingo

A MULHER NO III REICH

Durante os anos de luta, não passou despercebido a Adolf Hitler o papel importantíssimo que a mulher, como companheira do homem, podia desempenhar na propagação do movimento nacional-socialista. "Sem a constância e o espírito ou de sacrifício verdadeiramente fervoroso da mulher", disse o Führer na última Assembleia do Partido em Nuremberg, "jamais eu teria podido levar o Partido à vitória". Com sua chegada ao poder, o Führer reconheceu todo o significado da mulher e seus distintos valores em ação, tanto na vida política em geral, como na política demográfica, a assistência social e outras instituições, nas quais sua paciente, amorosa e delicada colaboração é de um valor inestimável.

Contestando a uma pergunta que junto a alguns colegas da imprensa estrangeira dirigimos a Presidente da Juventude Feminina, Sra. Gertrud Scholtz-Klink, na qual lhe rogávamos que nos explicasse que pontos de vista ideológicos guiavam a mulher alemã em sua intervenção no movimento nacional-socialista, Gertrud nos respondeu em uma conferência pronunciada no Hotel Kaiserhof, com as seguintes palavras: "Nossa ideologia, que afetava a todo nosso povo em suas raízes mais profundas, não foi determinada por considerações materiais, senão pelo próprio espírito deste povo. Quando se trata de coisas espirituais, não é já a maioria quem decide, senão a força imanente de cada individuo. Esta intuição a tinham não somente os homens alemães, senão também muitas mulheres alemãs, que nos anos de luta, para ganhar a alma do povo, foram as companheiras incondicionais e decididas destes homens. Esta atitude resulta em incondicional por nossa parte em favor do Nacional Socialismo, nos foi reprovada em certas esferas da sociedade, como uma traição aos interesses particulares da mulher. Sobre isto, quero expressar nesta ocasião com toda a seguinte clareza: o mandato fundamental da ideologia nacional-socialista, desde sua fundação até hoje, reza assim: o interesse da coletividade está acima do interesse particular. E, assim sendo, mesmo que não nos fosse possível ajudar a todo o nosso povo, não podíamos pensar de modo algum em por em primeiro lugar qualquer desejo ou necessidades particulares da mulher. Mesmo ardendo no coração dos homens alemães o anelo de encontrar os caminhos para o saneamento do nosso povo, era para nós, mulheres, muito mais importante a totalidade do povo que as aspirações e os desejos próprios".

No estrangeiro, a mulher alemã tropeça com uma série de prevenções e opiniões erróneas sobre sua atuação política, que tem origem no insuficiente conhecimento da Alemanha e do povo alemão. Uns crêem poder formar-se uma ideia da mulher alemã considerando a berlinesa mundana, esbelta e elegante, que leva de passeio ao seu lindíssimo cão de largo, de pelo grande e sedoso, pela do Kurfürstendamm, ou conduz seu "Mercedes" de linhas modernas pelas estradas aos belos arredores de Berlim; outros se atendem ao tipo burguês da "Margarita", com suas cores naturais, seus olhos azuis e as tranças loiras que caem sobre os ombros. Este juízo seria tão falso como o fora o de valorizar a mulher francesa pela parisiense emperiquitada dos grandes Boulevares.

A mulher alemã é geralmente de uma elegância sóbria e de uma franqueza alegre e espontânea. Ainda quando sob o novo regime, não assiste aos cursos universitários com o mesmo zelo de antes, não ambiciona cargos políticos, conservando assim, sem sombra de dúvidas, uma elevada educação geral, assim como seu interesse pela música, pela literatura e belas artes. Principalmente pode se observar, por exemplo, no ônibus ou meios de transporte, a mulheres e meninas lendo seus autores prediletos; nas salas de conserto, o sexo feminino constitui a maioria do público, escutando a música com um recolhimento quase religioso. Digno de assinalar é também a atração das mulheres pelo esporte. Isto está demonstrado pela intensa participação feminina nos exercícios de cultura física, e as numerosas sociedades esportivas femininas que existem em todas as cidades da Alemanha. Seu interesse em todas as organizações desportivas, desde o esporte ligeiro até a natação, as carreiras pedestres e os concursos de esqui, é cada vez maior.

Mas, sobre todas as coisas, a idéia de família dirige e inspira com preponderância à mulher alemã; o sonho de seu futuro lugar é o que consome seu coração. Não o tipo "garçonete", senão que é consciente de que há de chegar a ser mulher, e seu coração é sempre sensível à eterna canção de amor. Manifesta seu entusiasmo ao escutar os discursos políticos de Hitler, ou ao tomar parte nas grandes manifestações públicas nacional-socialistas, mas sempre se entusiasma com o desejo de ser mulher, e sua missão de futura mãe e como tal, é da mesma condição e índole que todas as demais mulheres do mundo. Toda esposa põe o maior empenho em ser considerada como boa ama de casa, e pode demonstrar o que tem aprendido na casa de seus pais, nos cursos de economia caseira, organizados pela Associação Feminina Nacional-Socialista, ou em qualquer das numerosas escolas privadas. As jovens prometidas tiram aprendizado em todos os ramos da economia caseira, com a finalidade de logo poder oferecer a seu esposo um lugar atraente e alegre, confortável e bem administrado.

O cumprimento das funções que como mulher a incumbem, a alemã se sente responsável perante a coletividade. "Nós", me dizia uma vez uma colaboradora da Associação Feminina Nacional-Socialista, "servimos a vida de nosso povo e consideramos o trabalho do nosso lugar como um meio de alcançar e manter a saúde tanto física como espiritual dele, valendo-nos das fontes de energia da nossa própria economia”.

A nova ideologia operou na mulher alemã uma profunda transformação, que se reflete tanto no seu interior como no seu exterior. Milhares de mulheres da juventude hitlerista se orgulham de levar seu sensível vestido de jaqueta parda e falda negra, tendo suprimido o ar e desejando crescer de novo suas tranças. Isto significa também o retorno da juventude feminina aos princípios originais da moral, a uma maior estima pessoal e a um maior respeito da opinião alheia, sem com isso pecar de vaidade exagerada. A isto contribui também o fato de que o homem voltou a sentir um maior respeito pela mulher. O aumento das possibilidades de trabalho, a incorporação dos jovens ao Serviço de Trabalho, o Exército, foram barrados das ruas e dos locais quietos repletos de senhores que gostam dos jogos, proporcionando-lhes a ocasião de conhecer as regras de conduta de uma coletividade ordenada e, entre outras coisas, o respeito à mulher.

A relação ao novo sentimento da moral e bons costumes que se está inculcando à juventude feminina se expressa na interessante declaração dada pela Chefe da Juventude à Associação de Jovens Alemãs: "Vós, as moças do nosso povo, tereis de trabalhar e educar-se como aquelas que em seu tempo querem ser também as mães do nosso povo, as esposas dos nossos homens. Os homens que formarão o porvir do povo alemão, necessitam mulheres de vossa condição. Mulheres que estejam dispostas com profunda convicção e valentia, a compartilhar com seus maridos todos os sacrifícios e todos os rigores da vida. Esta é uma elevada aspiração para cada uma de vós, pela qual bem merece a pena fazer-se forte, disposta e capaz, durante muitos anos, e conservar-se e permanecer pura, para poder cumprir deveras esta missão". Por geral, a jovem alemã se sente satisfeita se pode trabalhar até seu casamento em uma oficina, comercio ou fábrica, para desta maneira aliviar a carga de sua manutenção a sua família. Geralmente contribui com uma parte de seu salário aos gastos de casa, e, além disso, ela mesma custeia os pequenos desembolsos destinados a suas necessidades pessoais e o seu recreio. A jovem alemã sente uma grande inclinação para a assistência aos enfermos, cuja função requer na Alemanha a inscrição a distintos cursos de estudo e uma instrução prática, durante um tempo relativamente longo.

Quando a jovem alemã contrai matrimônio, abandona alegremente seu oficio, ainda que ofereça os melhores auspícios econômicos imagináveis, para dedicar-se por inteiro ao seu lugar e à sua família. A maioria dos casamentos celebrados com ajuda do empréstimo matrimonial que, como já foi dito, somente se concede no caso da mulher renunciar a toda atividade profissional, pode servir de demonstração do que acabamos de dizer. O Nacional Socialismo determinou exatamente a função da mulher e seus deveres para a coletividade. O mundo da mulher e do homem. A natureza os fez a repartição justa, colocando o homem à frente da família e o impondo, ademais, como uma obrigação de maior proteção ao povo, à totalidade. O mundo da mulher feliz reside na família, na convivência com o marido e filhos e no lugar; desde ali pode levantar logo a vista até a totalidade de seu povo. Ambos os mundos constituem juntos uma só unidade, dentro da qual vive e se mantém um povo.

À parte dessa missão natural da mulher, o Nacional Socialismo não intervém em nenhum modo para induzi-la a invadir a esfera de atividade do homem. Apesar disso, o Nacional Socialismo protesta contra a imputação muito comum no estrangeiro, de que não se querem conceder liberdade nem igualdade de direitos à mulher. Em um dos seus últimos discursos, disse o Führer: "Mesmo que dispuséssemos de homens fortes e saudáveis (e disso cuidaremos nós, nacional-socialistas), não se formará na Alemanha nenhuma companhia feminina de combate, nem nenhum batalhão feminino de atiradoras. Isto não seria igualdade de direitos, senão inferioridade dos direitos da mulher".

Um campo de ação incomensuravelmente amplo se oferece para a mulher na nova Alemanha. Desde logo, não se trata em modo algum de fazer-se renunciar o exercício de profissão. Somente se pretende proporcionar-lhe em ampla escala a possibilidade de contribuir à fundação de uma família e ter filhos, já que assim beneficia ao povo de melhor maneira. Se atualmente um jurisconsulto feminino demonstra sua capacidade no foro, e a seu lado há uma mãe que criou por si mesma cinco, seis ou sete filhos, o labor e o sacrifício desta mãe, conforme os conceitos nacional-socialistas sobre o valor eterno de um povo, vale muito mais que a realizada pela primeira mulher. O Estado, segundo a opinião de Hitler, tem o dever de fazer possível ou, pelo menos, de facilitar a todo homem e a toda mulher casar-se segundo as ordens do coração. O Governo se esforça na solução deste problema por meio da legislação, com o propósito de criar uma raça que, acima de tudo, seja forte e sadia.

A designação de homens e mulheres às funções peculiares de seu sexo, não implica nenhum menosprezo para a mulher. Não faz mais que estabelecer as diferentes condições naturais e está muito distante de relegar a mulher a um plano secundário. A missão da mulher alemã no novo Estado é muito superior à de ser, tanto na política como na profissão, um fator de competência para o homem. Igualmente é falsa a suposição de que a atividade da ama de casa seja improdutiva. Esta é uma frase que na Alemanha da época anterior chegava a ouvir-se com bastante freqüência; tal frase somente podia engendrar-se no pensamento de uma época que por produtividade, não entendia outra coisa que a vantagem pessoal e da própria família, uma vantagem que poderia contar-se ou palpar-se, mas nunca o interesse superior da totalidade do povo, que por sua vez também beneficia indiretamente ao individuo particular.

A Associação feminina nacional-socialista e a Obra feminina alemã tiveram suas origens nos dias de luta do partido como organização de mulheres nacional-socialistas. Sua estrutura geral é paralela a do Partido: à frente da mesma está a Sra. Gertrud Scholtz-Klink. As divisões inferiores estão organizadas em células regionais, de distrito e locais, em blocos. O número que mulheres chega ao total de onze milhões.

Com a chegada de 30 de janeiro de 1933, ficou livre o caminho para a realização do programa fixado de antemão: a obra feminina alemã surgiu com o objeto de reunir as numerosas associações femininas, pequenas e grandes, às quais falta a direção unitária e a base ideológica nacional-socialista. A Obra feminina alemã representa atualmente o grande lugar comum para todo o sexo feminino alemão. A ela, pertencem todas as organizações, associações e afiliadas particulares, que tomam uma parte ativa na obra comum do povo. A ama da casa e a estudante universitária, a mestre a e enferma, a trabalhadora e a artista, estão agrupadas em uma só comunidade de trabalho.

Por trás de ventosas árvores da rua Derfflinger, no oeste de Berlim, se encontra o novo edifício da Associação Feminina Alemã. Compreende quatro seções administrativas e cinco grandes seções principais de trabalho. As seções administrativas têm a seu cargo a administração das seções diretivas, a organização geral da imprensa e propaganda. Alguns dados sobre as cinco seções principais de trabalho contribuirão ao leitor com uma idéia da atividade extraordinária desta instituição.

A seção de "Cultura, Educação e Instrução" tem como campo de ação: a instrução ideológica (a ela pertencem as duas escolas normais de trabalho em Coburg e Berlim, assim como as 32 escolas regionais para as chefes femininas, que até agora compreendem 100 mil moças e mulheres), biologia, cultura física, educação da juventude feminina, belas artes aplicadas, literatura, jogos populares e recriação durante as horas livres.

A seção de Assistência maternal tem em sua jurisdição: Educação da mãe, higiene, cuidado com as crianças de colo e educação, arrego do interior do lugar e gestações sociais.

A seção de "Economia nacional e caseira" compreende os setores: Economia nacional, economia caseira, alimentação, instrução para as amas de casas, indumentária habitação e vivenda. Esta seção tem a seu cargo a direção de todas aquelas questões de política econômica que atenham à mulher em sua qualidade de administradora da casa e consumidora.

A seção "Estrangeiro e povos fronteiriços" tem a missão de aconselhar e instruir as estrangeiras, e tem a seu cargo manter as relações com os setores femininos dos países fronteiriços e das colônias de além-mar.

A seção de "Serviços auxiliares" estão compreendidas a ajuda feminina da Cruz Vermelha, a colaboração na ação de Beneficência nacional-socialista, no "Auxilio de Inverno", na obra "Mãe e filho" e na Associação nacional de defesa aérea.
A qualidade de afiliada da Associação feminina alemã proporciona a todas as mulheres a possibilidade de contribuir com seu trabalho e sua atividade a serviço de alguma destas seções, e com isso ao da coletividade.

Uma menção especial merece a Obra nacional de assistência materna. Sua missão é a de facilitar o futuro das mães, os conhecimentos ideológicos e práticos necessários, que é uma condição elementar para a criação de uma família forte e sadia. A Organização Feminina descartou toda atividade teórico-rotineira, adotando, em seu lugar, uma forma prática. A mulher recebe assim aqueles conhecimentos que lhe permitirão a aplicação adequada de sua força espiritual, e com isto virá a constituir para a nação uma geração de mães conscientes das necessidades de seu povo.

A educação pré-maternal tem a seu cargo a preparação tanto física quanto espiritual de mães aptas e compenetradas da responsabilidade que lhes incumbe, e que possam atender ao cuidado e educação de seus filhos, como também estão à altura de sua missão enquanto os deveres de casa. A educação compreende três grupos de ensinamento: Administração da casa, com cursos de cozinha e técnicas de costura; higiene, com cursos sobre o tratamento das crianças e higiene geral e cuidado médico caseiro, e, por último, cursos sobre educação, com instruções para trabalhos manuais, decoração do interior do lugar e lições sobre costumes populares.

Os cursos duram várias semanas. O numero de participantes cresce continuamente. Em 1935 participaram em torno de 186 mil mulheres. Em 1937, seu número subiu para mais de 1 milhão. O número de escolas para mares se eleva a 220, completando outras quatro especialmente para as mulheres pertencentes aos territórios assolados por calamidade pública, que não podem seguir com os cursos, mas que estão capacitadas para propagar seus conhecimentos entre sua vizinhança. Além disso, existe em Wedding-Berlin uma escola nacional para as mães, destinada a ser a oficina central e organizada, especialmente para a instrução de mestras.

Os mesmos cursos regem no campo da economia nacional. As mulheres e moças devem aprender a empregar aqueles bens adquiridos por meio do trabalho, em tal forma que possa justificá-lo ante a situação total de seu povo. Desta maneira, lhes será possível transformar uma existência penosa em uma vida bela e alegre. Com este fim, as jovens são educadas previamente no Serviço Feminino do trabalho obrigatório.

Além da Obra Feminina Alemã, a Associação Feminina da Frente alemã de trabalho, a qual corresponde da missão especial da instrução político-social da mulher, que consiste na luta pela honra do trabalho feminino e pela proteção da mãe trabalhadora. A diretora desta Oficina é a chefe nacional da Associação feminina, Sra. Scholtz-Klink. A Oficina feminina procedeu, entre outras coisas, a implantação de quatro disposições: o intercâmbio de postos de trabalho, o relevo periódico nos trabalhos pesados, o acordo com a Beneficência social nacional-socialista em favor das trabalhadoras em estado de gravidez, e a concessão de uma licença complementar para estas e sua substituição por moças estudantes.

Por meio do intercâmbio de colaborações, as mulheres cuja subsistência esteja assegurada de modo mais leviano, serão substituídas por homens. Isso se realizaria em sua maior parte, dando trabalho ao marido ou aos filhos a falta do mesmo. Outra forma de intercâmbio consiste no translado das mulheres a postos de trabalho ligeiro, e dos homens ao pesado. Isto foi levado a cabo em grandes proporções, e ali onde o trabalho do homem é executado, em casos especiais, pela mulher, que procurou nivelar seu salário com o do homem.

Até a nova reforma da Lei de proteção da mulher, a Oficina Feminina havia estabelecido um acordo com a Beneficência social nacional-socialista, segundo a qual as mulheres poderiam abandonar o trabalho quatro ou seis semanas antes do parto, recebendo, além de seu salário, um subsidio complementar. A substituição das trabalhadoras pelas estudantes tem sua origem no desejo de descanso mais prolongado, com gozo do salário completo, além da permissão que lhe corresponde por direito. Até agora, 2.600 moças estudantes e outras afiliadas da Associação Feminina Nacional-Socialista apresentaram serviço nas fábricas, proporcionando com isso às mulheres trabalhadoras ao redor de 43.000 dias de descanso suplementar, com pagamento integro de salário.

A Sra. Scholtz-Klink é ao mesmo tempo chefe nacional da Liga nacional feminina da Cruz Vermelha alemã. Deste modo, também esta instituição internacional recebe um impulso extraordinário. Em virtude de um convênio especial, a Cruz Vermelha alemã tomou a seu cuidado a instrução das afiliadas da Associação feminina nacional-socialista para sua formação como pessoal auxiliar feminina. Desta sorte, o serviço de sua colaboração poderá absorver uma corrente de mulheres, dispostas ao cumprimento de suas obrigações políticas e previstas de um espírito de responsabilidade para a coletividade do povo, com maior razão, porque a mulher alemã, como temos mencionado já, possui uma inclinação natural para a assistência aos enfermos. As enfermeiras da Cruz Vermelha trabalham em colaboração com os elementos femininos da comunidade nacional-socialista de Beneficência social, em assistência aos enfermos e aos jardins de infância, e prestam seus serviços em ocasião de manifestantes populares, reuniões políticas no aeródromo de Tempelhof em Berlim, nos Congressos do Partido em Nuremberg, nas reuniões de Bückeberg, etc. Atualmente, a Cruz Vermelha alemã tem a seu serviço 91 mil enfermeiras e ainda há muito que se fazer. Os trabalhos realizados durante estes seis dias demonstram claramente que a obra acabará por ser terminada e desaparecerão muitos dos obstáculos atuais. A Sra. Scholtz-Klink me dizia em uma ocasião:

"Nós prosseguimos nosso próprio caminho, caminho este que nos conduz a nós mesmas; nossa própria estimação nos impõe continuar conseqüentemente por este caminho. Se o destino nos interpõe, como somente suceder a todo povo, obstáculos no caminho, não devemos tropeçar neles, mas que construiremos degraus para escalar mais acima ainda. Esta atitude nossa deverá ser apreciada também por todos aqueles homens que amam a seu povo da mesma maneira que nós amamos ao nosso".


SANTORO, Cesare. Der Nationalsozialismus. Berlim, 1936.